segunda-feira, 31 de maio de 2010

Paradoxando

A vida que a vida nos reserva é sempre paradoxal. Para que haja vida é necessário que exista a morte. Para ver o que é bem é preciso enxergar o mal. Bom e ruim. Doce e amargo. Dor e alegria.
A maior virtude e a maior desgraça do homem é a sua necessidade de se relacionar.

quarta-feira, 26 de maio de 2010

Do cão eu sou dono

Ficar sozinho e em silêncio é, num primeiro momento, assustador. Silenciar tudo para ouvir-se é muito pior. Esvaziar a mente, congelar os movimentos, deixar a alma livre para se expressar como quiser é o próprio desespero. Pois entramos em contato com aquilo que mantínhamos preso para não espantar os outros. Ouvimos os latidos daquilo que somos e não queríamos ser, os uivos do que tentávamos segurar na coleira, esconder na casinha ao fundo do quintal, para não pular a cerca do coração e invadir as casas vizinhas.

Tenho um companheiro de caminhada que admiro muito e é pastor, que algumas vezes ao pregar, citava uma música de uma banda de rock brasileira (a qual não lembro o nome) que dizia em seu contexto que apenas somos nós mesmos quando estamos sozinhos nos nossos quartos, quando ninguém nos vê. Isso é o que nos assusta, descobrimos quem somos, como é o cão que alimentamos no fundo do nosso quintal. Esse mesmo pastor,conta uma história de um índio que dizia que dentro dele existiam dois cães, um bom e um mal. Todos os dias estes cães brigavam, e vencia aquele que fora melhor alimentado. Este é o problema de ficar em silêncio, ouvimos o rosnar dos cães.

Em alguns textos do blog, dissertei ou expressei meus pensamentos sobre o "mal", "demônios", "Diabo" e afins. Neste, pretendo continuar a linha de pensamento que guiou aqueles. Assistindo um filme uma vez, ouvi um diálogo que me abriu os olhos:
"Você não acredita nos homens?", "Sim, nos homens eu acredito. Só não confio no demônio que existe dentro deles". Se existe algo que me assusta, é o Diabo. Mas não aquele chifrudo, vermelho, com tridente e cara de mal, e sim aquele que se parece muito comigo, aliás, que existe dentro de mim. Aquele do qual sou dono e alimento todos os dias. Se existe alguém que precisa ser "amarrado", esse alguém sou eu. Se existe alguém que precisa ser "expulso", esse alguém sou eu. Não o "eu" inteiro, mas aquele eu que luta comigo, aquele eu que quer a mim e não ao outro. Aquele eu egoísta, que mente para o seu bem, que vive para seu nome.

Lutero "lutava com o Diabo" durante as noites. Dizia-se tentado e perseguido por ele, por isso as noites quando o via, lutava e "vivia em pé de guerra". Lutava consigo mesmo. Era tentado pelo cão que ladrava alto querendo ser solto da coleira e fugir do quintal. E nesse caso, esse cão ladra e morde. Temos um chamado cristão para aprendermos a lidar com esse "eu", com esse cão que existe dentro de cada um. Aprendermos a morrer para nós mesmos, seguir os passos de um Cristo que esvaziou-se de si, viver numa única Lei, o Amor, pensar no outro, ser o outro, sentir a dor do outro e compreender que a vida ganha não é baseada no meu egoísmo mentiroso, no meu Pai da Mentira que me tenta em meu deserto, mas sim aquela que é dada pelo outro, testemunho para o outro, mártir para o outro. Menos de mim e mais de Deus, mais do outro. Hoje não sou mais eu, mas Cristo vive em mim.

Precisamos aprender a sermos livres! A não ouvir mais os latidos e os uivos deste cão insaciável quando ficarmos só e em silêncio, quando nos retirarmos para nossos desertos. Precisamos compreender que para liberdade fomos libertos, para tomarmos nossas atitudes de maneira independente, consciente, humana e não canina. Sermos homens e mulheres humanos, e não apenas animais que vivem influenciados por ladros, uivos e instintos. Sermos conscientes, livres, maduros, capazes de dar os próprios passos e trilhar a carreira que é proposta. Sem medo de nos apresentarmos por inteiro, sermos íntegros, abrirmos nossas casas e mostramos até o nosso quintal.

O meu maior medo não deve ser um terceiro, não deve ser um adversário, mas o meu eu, o meu cão, o meu Diabo. Para onde fugirei de Deus? Seja onde for sempre estarei em suas vistas, e aliás, frente a Deus sempre estou nu, desprotegido, inteiro. Não adianta ocupar a vida para não perceber o silêncio e o aquilo que somos, pois uma hora chega os dias de deserto e os latidos aumentam. A coleira não é forte o suficiente para segurar para todo sempre. Mas preciso aprender a guardar a Palavra em meu coração, preciso aprender a me entregar por inteiro, preciso aprender a me transformar todos os dias, a morrer todos os dias, para de glória em glória ser semelhante a Cristo.

A minha caminhada deve ser menos de mim e mais do outro. Deve ser o amar ao próximo como a mim mesmo. Não fugir de mim, não esconder o que sou, mas entrar em contato com isto, ver, ouvir e reconhecer meus cães, para ser transformado, para aniquilar a mim mesmo, esvaziar este meu eu, e deixar que Cristo viva em mim. Do cão eu sou dono, e preciso decidir se quero no dia mal, no silêncio, no deserto, na noite, ouvir uivos e latidos, ou descansar Nele, entregando meus medos e ansiedades em Suas mãos, trabalhando com parceria e cumplicidade, reconhecendo a necessidade de mudança, silenciando este cão, e ainda que ande pelo Vale da Sombra da Morte, não temerei mal algum, ainda que tudo se cale e eu veja quem sou, não temerei mal algum, ainda que tudo aconteça não temerei mal algum, pois Tu estás comigo. Do cão eu sou dono. Agora, quero ouvi-lo e silenciá-lo? Ou quero escondê-lo e esperar que solte-se da coleira?

terça-feira, 18 de maio de 2010

Erro Pedagógico

"Errando que se aprende", se esta frase estiver errada, até que faz sentido. Erramos muito ao repeti-la, e hoje, acho que aprendemos que deve ser reconstruída. Não faz mais sentido, e nem cabe no cotidiano e na aprendizagem de um ser humano do "século XXI", depois de bilhões de anos de evolução, milhares de anos do homo sapiens, milhares de anos de filosofia, 2 mil anos da era cristã, expressar a idéia de que só depois de cometido um erro é que se aprende.

Repensei e "filosofei" sobre esta máxima depois de muito ouvir dentro das igrejas que "Deus permite o erro pois sabe que é pedagógico", que ele nos perdoa e nos permite "pecar" (cometer infrações ou erros) porque é "errando que se aprende". Dizer que o erro é pedagógico é contribuir para um "erro pedagógico", que faz parte da Didática do Erro. A base desta didática é o exemplo do bebê, que cai muitas vezes até aprender a permanecer de pé e andar. Então, é necessário cair para aprender a se levantar.

Um erro só se torna erro depois que é percebido como erro. Só se percebe a mentira frente a verdade. É assim que funciona: o erro só é percebido depois de constatado o "acerto". No caso religioso, só se tem a percepção de que um pecado é pecado, depois que este é revelado como tal. Um pecado só é cometido depois que se tem ciência de que é pecado. Um ato pelo ato não é pecado. Mas, se existe a consciência de que o ato é pecaminoso e mesmo assim é praticado, aí torna-se "pecado". Onde quero chegar com isso? No chão. Só se pode cair estando de pé. Não é caindo que se aprende a levantar, mas é estando de pé que se descobre o que é cair.

Para Sören Kierkegaard, ignorar aquilo que se sabe é que é pecado, errado. Depois de consciente de algo, ignorar este algo é o "verdadeiro erro". Por isso escreve sobre uma Teologia da Revelação, na qual a medida que Cristo é revelado para o homem, este se torna mais responsável por si e pelo que faz. Mas apenas a partir da Revelação é que se "cobra uma postura ereta", o ficar de pé. Precisamos trocar nossa Didática do Erro, este erro pedagógico, por um novo tipo de aprendizado, resgatar algo que se perdeu no tempo, a Didática da Confiança.

Porquê devemos ouvir nossos pais? Porquê é certo? Porquê é errado? Porque eles tentarão nos esclarecer de acordo com sua experiência aquilo que faz bem e aquilo que faz mal a vida. Devo ouvi-los por confiar neles. Porquê relação sexual sem "camisinha" é prejudicial? Porque você pode contrair uma doença sexualmente transmissível ou ainda engravidar sem um planejamento adequado. É preciso ter uma relação sexual sem "camisinha" para se descobrir isto? Não. Preciso confiar em informações que me são dadas, nas histórias de pessoas que no passado viveram este tipo de situação, na medicina e por ai vai. Assim como para qualquer assunto. A Didática da Confiança é baseada nesta idéia.

Devemos aprender ouvindo e depositando nossa confiança nos outros, nos conselhos, nas histórias vividas. Porquê hoje olhamos para a História humana e definimos "erros"? Porque enxergamos os desdobramentos e consequências do que aconteceu. Não é pedagógico errar de novo (lembrando que até o que hoje é erro antes não o era) para tentar me levantar. É pedagógico sim transformar o erro como um meio de aprendizagem. Mas muito mais pedagógico, é ensinar a olhar para cima, para aquilo que é mais velho, que já foi, e buscar ou uma mão que me ajude a me manter em pé, ou observar como "eles" se mantém ou mantiveram em pé.

A missão de uma Didática da Confiança é ensinar a ouvir e confiar. Antes do erro, que é inevitável, perceber a voz do passado que não é o nosso, analisar o que está a volta, aquilo que foi, que é, instrospectivamente, silenciar a ânsia e os desejos e deixar a consciência e os conselhos falarem mais alto. Condicionarmos aquele que aprende a não inventar respostas e tomar atitudes, mas descobrir as que já foram dadas e reinterpretá-las para um novo passo. O velho chavão de que "ninguém inventa a roda". É necessário confiar naquilo que foi dito, dar ouvidos aos conselhos e advertências. Ter fé. Didática da Confiança é retomar a fé que se deve ter na família, na comunidade, nas pessoas e combater a esquisofrenia do "deixar errar", "deixe-o errar que ele aprende". O medo, a indiferença, a desconfiança da Didática do Erro geram distâncias e frieza. Não ensinam independência, mas individualismo.

Não é errando que se aprende, mas ouvindo. Ouvindo para não errar. Analisando o que já foi vivido, sentido, consentido e praticado, confio e ouço, reinterpreto e aprendo a fazer meu caminho. Construo meus passos, mantenho-me de pé, ciente de que não pretendo cair. Tenho fé. Desenvolvo minha independência. Formo uma cabeça não apenas minha cheia do pouco que sou, mas complexa, ampla e preenchida por muitos antes de mim, por muitos que estão comigo. Consigo ter minhas idéias compartilhadas e dialogando com as antigas, novas, super novas e me ajudando a dar mais passos e cair menos. Confiar no que foi dito. Confiar nos conselhos que nos dão. Confiar na história e nos valores que geram vida. Que para muitos é simplesmente desenvolver uma expansão de consciência humana, e para mim, é desenvolver minha fé e conhecer mais a Deus.

sábado, 15 de maio de 2010

Deus e homem

O que está entre Deus e o homem? Outros homens. Não se enxerga a Deus se não for através de um homem. Nem se olha um homem, se não for com os olhos de Deus. O Deus que se fez homem, e que façamos o homem a imagem e semelhança de Deus.

Bruno Reikdal

quarta-feira, 12 de maio de 2010

"Panim el Panim"

O encontro de dois que se fazem um. As vidas que partilham do mesmo ar, do mesmo efeito, do mesmo respirar, do mesmo jeito. O fôlego soprado no pó, o fôlego que gerou vida. "Panim el Panim", "Face a Face". Rosto a rosto, olho no olho, os lábios são um. O beijo, o amar. O mesmo fôlego, o mesmo ar, o mesmo respirar. O amor que gera vida. Panim el Panim, Face a Face. O beijo, um amor, duas vidas.

terça-feira, 11 de maio de 2010

Durante o "Pai Nosso"

"Vocês, orem assim: "Pai nosso, que estás nos céus! Santificado seja o teu nome. Venha o teu Reino; seja feita a tua vontade, assim na terra como no céu. Dá-nos hoje o nosso pão de cada dia. Perdoa as nossas dívidas, assim como perdoamos aos nossos devedores. E não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino, o poder e a glória para sempre. Amém."

A oração de Cristo. A tão repetida antes de jogos de futebol, missas, ceias, reuniões religiosas ou antes da prova do vestibular por todos aqueles que estão com medo (mesmo se forem ateus). Um diálogo de Jesus com o Pai para explicar as bases de uma oração.

Em primeiro lugar, a oração é nossa! Não é minha, tua, dele ou dela, mas nossa. A compreensão não de apenas um dependente de Deus, mas o Todo que vive por causa da graça de Deus. Uma oração não é uma relação individualista com Deus, mas uma parceria com Ele e com os homens.

Para comprovar ou compreender melhor esta idéia, em segundo lugar é "venha a nós o teu Reino; seja feita tua vontade", nossa relação com Deus é compartilhar os nossos corações, mostrar os nossos e ouvir o de Deus, para sermos condicionados pelos valores do Reino e da vontade Daquele que dizemos amar e seguir. Aquele que nos faz sentirmo-nos amados. Aquele o qual queremos mostrar para todos. Mas se não o conhecemos e nem oramos para ouvi-lo, como expressaremos os valores que se guardam em Seu coração? Compartilhar, dividir, repartir: "Dá-nos o pão NOSSO".

As bases da oração partem agora para uma outra direção, não apenas na verticalidade do ser da terra com o ser do Céu, mas do ser da terra com o outro ser da terra. Uma comunidade. Os valores do Reino de Deus (o Seu perdão para conosco) nos guiam em nossa vida, nas nossas relações com o outro, como Deus perdoa, nós perdoamos. O movimento parte também do nós para o nós. A oração não é "para mim", mas para nós.

E para fechar a beleza da oração e da relação com o divino, que eu não seja eu, mas nós, eu e Deus. Que eu aprenda a me esvaziar de mim e estar cheio de Ti. "Não nos deixe cair em tentação, mas livra-nos do mal, porque teu é o Reino (que me condiciona), o poder e a glória para sempre.". A kenosis humana. Me esvazio de mim, assim como Cristo se esvaziou de si, para ser cheio de Ti, não pelo poder e pela glória, mas para não cair em tentação e ser livre do mal. Para que os valores da oração até agora descritos sejam de fato verdade e vividos.

Então, que assim seja. "Amém."

Antes do "Pai Nosso"

"E quando vocês orarem, não sejam como os hipócritas. Eles gostam de ficar orando em pé nas sinagogas e nas esquinas, a fim de serem vistos pelos outros. Eu lhes asseguro que eles já receberam sua plena recompensa. Mas quando você orar, vá para seu quarto, feche a porta e ore a seu Pai, que está em secreto. Então seu Pai, que vê em secreto, o recompensará. E quando orarem, não fiquem sempre repetindo a mesma coisa, como fazem os pagãos. Eles pensam que por muito falarem serão ouvidos. Não sejam iguais a eles, porque o seu Pai sabe do que vocês precisam, antes mesmo de o pedirem."

Quando converso com meu pai eu utilizo certas expressões, palavras, tons de voz e contruções do diálogo. Sou mais objetivo, prático, acadêmico e mais preocupado com a réplica que terei frente minhas argumentações. Já quando converso com minha mãe, utilizo outras certas expressões, outras palavras, outros tons de voz e outras construções de diálogo. Sou mais irreverente, simples, passional e me preocupo menos com a réploca que terei frente minhas argumentações. Quando converso com diferentes amigos de diferentes grupos então... Mudo completamente minhas palavras e maneiras de dialogar.

Isso acontece porque para cada pessoa que conheço tenho uma imagem e tento me precaver das reações que estas pessoas terão. Então, conhecendo um pouco de cada uma, sei como posso e devo conversar. Não imagino que seja muito diferente na relação com Deus. Como me relaciono com Ele dependerá de como o "vejo".

Quando tratamos do assunto "relação com Deus" (ou com o divino, transcendental, sei lá), projetamos esta relação em presses, orações, petições e promessas. Um "diálogo" entre o "terreno e o celeste", o "visível e o invisível", o "humano e o divino". Apesar de em minha filosofia (ou teologia, ou ainda fé) a relação com o divino não se prende a "falar" com o que não vemos, é necessário que se compreenda o como tentar conversar com Deus.

Se para mim Deus é um tirano, minhas orações sempre serão implorando perdão e eu me vejo sempre como o pior dos seres, devedor e passível de sofrimento e castigo. Se para mim Deus é um general em guerra, eu orarei sempre como uma declaração "patriótica" de fidelidade e me portarei como um soldado em combate ao lado de um general que precisa aumentar o exército, precisa de ajuda. E ainda, se Deus para mim é quem me prometeu algo e não cumpriu, logo um devedor, minhas orações serão de exigência e combrança para com o divino, eu serei o "recebedor" de uma bênção que Deus me "deve". Para fechar, se pretender um pouco mais longe, se Deus para mim é uma caixinha de surpresas, uma caixinha das promessas, um "realejo", minhas orações sempre serão na esperança, ou melhor, na ilusão de que tudo vai dar certo e eu serei o jogador da loteria que espera ter o número sorteado.

Entretanto, o grande problema de todas estas maneiras de imaginar Deus (os nossos ídolos divinos) não tem nada, nenhuma relação, com a descrição que Jesus (Filho) faz de Deus (Pai) no trecho que introduz este texto, Mateus 6: 5 - 8. Quando orarmos não devemos ficar repetindo as mesmas coisas; sofrendo, implorando, iludindo, torcendo e/ou exigindo. Não precisamos muito falar, nem muito pedir, nem devemos, aliás, pedir. Pois o Pai que está nos Céus sabe o que pedimos antes mesmo de pedirmos. Agora, se oração então não é exigir, torcer, pedir, sofrer, implorar, para que serve?

A imagem de Deus expressa por Jesus é de um Deus bom. Se Deus não é tirano, nem general, nem devedor, nem realejo, como me relacionar com um Deus que ama? É complicado compreender que nos relacionamos com Deus simplesmente por causa de Deus. Sem querer encaixar e cumprir uma função para Deus: "responder petições". Nós olhamos para nossa vida e encaixamos Deus de alguma forma nela (como uma das opções citadas acima), ao invés do caminho que faz mais sentido, nós como criaturas termos uma "função", sermos encaixados em Deus. Não somos nós que o incumbimos de tarefas, mas Ele que nos chama. Agora a oração toma um tom mais sublime, de uma criatura que se relaciona não pelo que Deus faz, mas pelo que Deus é.

Oração agora é em secreto. Uma relação de intimidade, de abertura de corações ( http://brunoreikdal.blogspot.com/2009/04/oradorouvinte.html ). Não faço como os pagãos que repetem, pedem e imploram. Nem como os hipócritas que oram alto, em pé, aparecendo e tentando provar uma relação melhor com o divino. Mas em silêncio, converso com o Pai, abro meu peito, rasgo minha alma e sou recompensado por sua presença. O Pai pelo Pai. Deus por Deus. Minha recompensa é compreender e simplismente ser o amor que divinamente foi me dado por graça. Oro de graça e pela graça. Sou agraciado pela presença divina, sofro uma kenosis humana, e cheio do Espírito sei que posso ser a "resposta" de Deus para orações de outros. A recompensa é o Reino, o Deus, o condicionamento da minha vida pela graça...

Um Deus muito maior do que minhas pequenas petições.

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Haverá a "Justiça Divina"!!!

"Deus é justo, irmão! Aleluia!".

Destrinchemos e vasculhemos o que está implícito nessa frase. "Deus é justo", comecemos assim. Não, melhor, comecemos com "Aleluia", uma palavra comemorativa que traduzida para o português equivaleria a "mil glórias a Deus". Porquê quem profere esta frase glorifica a Deus? Algo bom deve ter acontecido ou há de acontecer. Bom para quem? Uma justiça que parte de um ser divino, eterno, imensurável, Todo-poderoso, que a tudo vê, preenche e coisa e tal, seria boa para alguém? Principalmente se este alguém for mera criatura imperfeita, pecadora, que o desobedece com frequência e não consegue nem compreendê-lo nem imaginá-lo?

Qual o motivo das graças? Simples, a Justiça de Deus. Porquê justiça aos nossos ouvidos nunca parece ser algo bom? Provavelmente porque o que chamamos de justiça seja uma reação apreciativa ou depreciativa dependendo da meritoriedade do indivíduo passível de acusação ou agradecimento. Traduzindo o que compreendemos por justica: "Você tem o que merece de acordo com nossas leis". Isso é assustador se imaginarmos que somos imperfeitos, incompletos, errôneos e errantes, pecadores e que nunca conseguiremos ser "semi-deuses", estar plenamente de acordo com Ele. A salvação que deveria ser o motivo da alegria do "Aleluia" proferido é a graça, o cerne da justiça divina. Vejamos:

O primeiro ato de Justiça divina foi a criação. Eu sei que não, mas suponhamos que o mundo tenha sido criado tal qual está descrito no mito ddo Gênesis judaico. Lembrando que mito não é uma história verídica e que se presta a ser fatídica ou científica, mas que pretende mostrar valores e conceitos de uma cultura, continuemos o raciocínio. Deus cria tudo, prepara um mundo, e a única regra estabelecida para o ser humano é não comer de um fruto específico (do "bem e do mal"), pois se comesse seria passível de, e punido com, morte. O ser humano come, mas não morre. Deus, em cumprimento de sua Justiça divina previamente mencionada no contexto ("se comer certamente morrerás"), não mata e nem deixa morrer este ser desobediente. Os tira do Paraíso e explica que a vida agora será mais complicada pois agora "conhecem o mal", mas continuam com vida.

Seguindo a história percebemos mais um grande relato da Justiça divina. A história de Caim, que tem um irmão chamado Abel. Caim é alertado por Deus que seu caminho mal trará morte. Caim não dá ouvidos, enraivesse, mata seu irmão e, quando questionado por Deus de onde seu irmão estaria, tenta mentir e "tirar o 'seu' da reta". Mais uma vez advertido por Deus, percebe que seu caminho o levará a morte. Teme, se assusta, "fica com o 'seu' na mão". Analisa a situação e se vê a ponto de morrer, será passível de morte, punido com morte pelos outros que o encontrarem no caminho! E Deus, justo, que já tivera avisado as consequencias, o marca para que não morra. Dá a Caim uma nova chance de vida. Agora marcado para que não morra, vai errante pela terra tentando se reestabelecer.

E dentro das narrativas bíblicas perceberemos homens e mulheres acusados, condenados, quebrados, desobedientes, doentes que ao invés de receberem seu "castigo", sua justa punição, obtém a Justiça divina, a graça. Noé, Abraão, Isaque, Jacó, Moisés, Davi... E por aí vai. Homens passíveis de punição, mas que pela Justiça divina conseguem a vida. Digno de morte que obtém a vida.

Um homem muito sábio disse: "Bem-aventurados os que tem fome e sede de justiça, pois serão satisfeitos". Com certeza a justiça deste homem não era meritória, era divina. Satisfeito será aquele que por justiça desejar e buscar a graça, o perdão, a vida. Como sei disso? Este mesmo homem muito sábio foi sedento por Justiça divina, foi o próprio Deus na terra, foi a Justiça divina encarnada, e seu fim foi ser julgado pelos homens. Uma justiça meritória o condenou a morte. Aquele que não merecia morrer foi morto. Em contra-pertida, seu anseio é que os dignos de morte vivessem.

"Deus é justo, irmão! Aleluia!". Quero dizer: Ele salvará aqueles que não merecem salvação. Ele dará vida aqueles que são dignos de morte. Satisfará aqueles que buscaram a Justiça, entregando a todos a mesma recompensa: Ele. Glória a Deus! Como é bom saber que não é por mérito, não é por atos, não é por obras, mas é dom de Deus! Essa é a Justiça!

quarta-feira, 5 de maio de 2010

Eu e mim. Mim e eu

Eram duas vezes...

Dois seres que viviam em apenas um. Eu e mim dividiam e repartiam o mesmo corpo. O eu era mais imperativo e ativo. Mim já era mais largado e sobrava sempre. Eu agindo e "verberizando", enquanto que mim esperando e complementando os fins das histórias. Eu nunca deixava nada para o mim, e o mim sempre preguiçoso nunca substituia o eu.

Desses atos e contos surgem os mitos que se conta a crianças para ensiná-las comunicação. "Mim não faz nada!", ou então, "Sempre eu! Sempre eu! Pense mais no outro menino!". O mim não faz, o eu sempre faz e a confusão está gerada. Um nunca quer o outro quer tudo para sí!

Um dia eu e mim nada podiam fazer. Ninguém falava, ninguém conjugava, ninguém sondava a possibilidade de conversar. Cada um em seu canto. Cada um com seu cada qual. Nada de "eu's" ou "mim's". Tanto mito e aprendizado separou todos de todos e os eu's dos mim's. Todos então perceberam que todos estavam na mesma situação. Todos saíram de seus cantos e de seus cada quais e caminharam para o centro. Os eu's e os mim's entreolharam-se. No silêncio a falta pareceu maior. Um dependia do outro. Eu e mim. Eu e mim. Agora não mais eu e mim, mas nós. Nem o eu nem o mim imperavam ou esperavam. Eu e mim agora eram um. Um ser completo. Uno. Nós. Nisso não se faz diferença, não há mais "Sempre nós! Sempre nós! Pense mais no outro menino!" nem "Nós nunca faz nada!". Porque o nós agora compreendia e compartilhava o outro. E o "nós nunca faz nada" não cabe, porque nós nunca faz, mas sempre fazemos...