sexta-feira, 29 de abril de 2011

Entre mensageiros e iguais

Depois de um dia em silêncio, numa cidade aparentemente pacata, dois mensageiros entraram na casa de um Anfitrião. O dono da casa não era bem "flor que se cheire", homem dos bons, mas sabido das artes da malandragem. Recepcionou os dois portadores de uma mensagem, preparou uma comida e enquanto ajeitava os aposentos de seus filhos para que aqueles dois desconhecidos pernoitassem, ouviu alguém bater à porta.

"Quem será?" - perguntou-se o Anfitrião. Era noite quente. Os humanos daquela cidade, do lado de fora da casa, reclamavam direitos sobre a vida daqueles dois mensageiros. Onde já se viu homens desconhecidos entrarem em uma cidade desconhecida e simplesmente encaminharem-se para a casa de um morador? Onde já se viu em uma cidade má alguém trazer uma mensagem sem nem ser aprovado pelos ouvintes?

Tenho dó daqueles dois mensageiros. Não, tenho mais dó ainda daqueles cidadãos. Em si carregavam maldade. Não carregavam atos ruins, mas maldade mesmo. Sua cidade era injusta e nenhum deles discordava da injustiça civil. Eram todos iguais. Todos iguais! Todos andavam juntos, batiam na porta juntos, gritavam juntos e ficavam cegos juntos. Aquele que com eles não andar merece sofrer em suas mãos! Onde já se viu dois mensageiros não passarem pela justiça da cidade?

Os dois mensageiros que na casa do Anfitrião se resguardavam foram ameaçados. Com o que? Com abuso! Seriam abusados por aqueles homens! O problema está no ato? Não, está na maldade dos cidadãos em abusarem do diferente, dos diferentes, dos dois visitantes e do Anfitrião (que lembrando: não era bem flor que se cheire). Onde já se viu alguém trazer uma língua diferente da nossa e não sofrer em nossas mãos?

Onde já se viu alguém trazer uma mensagem que ninguém está aconstumado a ouvir? Onde já se viu estrangeiros virem para nossa cidade e não se adequarem à nossa injustiça? Onde já se viu um Cristo descer dos céus e apresentar uma mensagem que todos não querem ouvir? Onde já se viu alguém trazer uma mensagem para ninguém, ou melhor, para os ninguéns? Estamos falando de todos... Onde já se viu dois mensageiros entrarem em nossa cidade sem serem convidados e testados? Onde já se viu um Cristo destruir tudo e reconstruir em três dias?

O Cristianismo não prega a morte, mas a ressurreição. O Cristianismo não se preocupa com o pecado, mas com o cuidado com o pecador. O Cristianismo não se preocupa com atos, mas com os tesouros dos corações. Em Cristo não pode haver morte, destruição e condenação para quem erra, mas sempre a Graça da Salvação! O que me dói nesta estória não é a atitude de uns, mas a postura de todos os iguais. O que me incomoda não é o "pecado" que se expressa, é a conformidade que se esconde. O que mais assusta é o abuso de todos os homens de uma mesma cidade sobre os diferentes. Os fundamentalistas que me perdoem, mas sodomia é a maldade de abusar da minoria.

Em Cristo a prostituta entra no Reino dos Céus antes dos religiosos. Em Cristo o menor é sempre o maior. Em Cristo um Deus poderoso morre. Em Cristo uma mulher digna de ser exaltada é a senhora que oferta uma única moeda. Em Cristo o publicano ora com mais fé do que o fariseu. Em Cristo a maior Lei é amar ao próximo (independentemente de quem seja ou o que faça). Em Cristo a vida vale mais do que os livros. Em Cristo Moisés diz algo, mas Cristo diz outro. Em Cristo o pescador é discípulo e o sacerdote inimigo. Em Cristo quem precisa de saúde são os doentes. Em Cristo as mulheres tem mesmo espaço que os homens. Em Cristo o Templo não vale nada perto de um coração. Em Cristo o Samaritano odiado é quem ama de verdade. Em Cristo cumprir a Lei não é suficiente, precisa vender seus tesouros e dividi-los com os pobres.
Em Cristo o próprio Deus lava os pés de seus seguidores. Em Cristo... Em Cristo... Em Cristo...

Em Cristo não há um só que não seja pecador. Mas também não há um só pecador que não seja salvo. Em nome de Cristo "Amai-vos uns aos outros".


Texto agraciado por Ana Beatriz Paulichenco:
Obrigado por me ensinar a ler esta estória Bíblica com outros olhos. Tua inspiração foi além do romance e transcendeu o "de-sempre". Que o coração continue aberto para os sentidos e os olhos atentos para as letras...

Gratis i Kristus

quarta-feira, 27 de abril de 2011

Jonas na barriga da Agonia

Quando eu era menino pensava como menino: achava que a estória de Jonas estava no Gênesis, muito provavelmente próximo ao dilúvio, talvez entre Noé e Moisés (que também se figurava no primeiro livro dos cinco primeiros). Sei lá se é porque nas três aventuras rola um mar, água, maldade e uma certa destruição, mas para mim eram todas próximas umas das outras. Aliás, eu nem imaginava a possibilidade de Jonas ter um livro só pra ele, e muito menos que um homem tão medroso e egoísta fosse chamado de profeta (mais tarde, para contentar meu péssimo senso de justiça, descobri que pelo menos era um profeta considerado "menor").

Em uma noite escura, daquelas que se segue depois de uma tempestade, apesar da "medrosidade" e egoísmo, o profeta fujão cala sua voz de denúncia e abre a porta de seu coração com uma chave das mais lindas já declamadas: "Em meu desespero clamei ao SENHOR". Este angustiado profeta, cegado pelo mar e à deriva da escuridão, descobre o medo que apavorava à pouco os marinheiros que com ele viajavam. Os homens lembram de Deus quando suas esperanças se esvaem.

No estômago da Agonia, uma espécie de peixe gigante que avança nos homens conhecedores de uma verdade que não vivem, o missionário, filho de Amitai, lembra do Deus que crê, da Voz que lhe chamou à sua missão, à vida, e sai da sepultura para a praia: "Aqueles que acreditam em ídolos inúteis desprezam a misericórdia. Mas eu, com um cântico de gratidão, oferecerei sacrifício a ti. O que eu prometi cumprirei totalmente. A salvação vem do SENHOR". Os homens lembram da misericórdia quando mortos, não por quererem viver, mas porque não querem morrer sem que sejam dignos da morte. Como diria Chaplin: "Há outra coisa mais inevitável que a morte; a vida".

Já na praia, confiante, tranquilo, talvez tendo alcançado o porto seguro que Agostinho procurara em sua "Vida Feliz", nosso Jonas esquece de seus passos, da Agonia, abandona a angústia e, obstinado, parte para cumprir uma missão. Não a missão da Voz que lhe chamara, a sua vida, mas para cumprir seu vazio desejo (ou desejo vazio). E a misericórdia? Para que se está vivo e longe de morrer? E Deus? Por que se não precisa de esperanças mais? Elas estão no celeiro e não se esvaem, mas seu dono não se alimenta delas. Toda dor e angústia não movem mais o homem, são esquecidas por ele. Ele não ama mais. Mas continuam no coração de Deus, o eterno amor que sempre lembra de seus filhos: "Não deveria eu ter pena dessa grande cidade?".

Nas noites frias e chuvosas, em meio a tempestades, quando esfomeado e em mendigância o medo bate à porta, vem o amor para abrigá-lo, alimentá-lo, esquentá-lo, dar um quarto, afofar o travesseiro e torná-lo um hospede tão grato, mais tão grato, que pedirá para sair de casa em busca de trabalho e de recompensar o bom amo(r) Samaritano que o amara. A angústia move a vida, a não conformidade move o homem. Sabendo disso, para que esperar que o mundo se acabe para salvá-lo? Para que esperar que um homem morra para chegar ao fim de uma guerra? Porque não sofrer desde já a dor comum à todos e dela gerar a vida? Deus tanto chorou e sofreu que sobre si carregou todas as nossas dores, que angustiado venceu o Getsêmani. A angústia não é ruim se lembrarmos dela enquanto ainda é dia, se lembrarmos de que Deus sempre é misericordioso. Não esperemos pela tempestade, pela desesperança, pela Agonia ou pela morte, em sentido contrário, vivamos desde já com amor e misericórdia, desde já lembrando de Deus, desde já abrigando os arrependidos e angustiados pelos que sofrem...

Para bom entendedor o contexto basta!


Gratis i Kristus

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Tempo bom

Nesse feriado revi um amigo daqueles que vez por outra faz falta e nas outras vezes preenche as conversas e a memória. Em nossa revisão vimos coisas novas, ensinamos e aprendemos um com o outro. Tempo bom...

O velho rádio quadrado em cima do balcão de madeira sujo e empenado por causa do calor chiava as notícias do dia. Em um dos intervalos entre o copo de cerveja suspenso levado à boca e o copo apoiado no balcão emadeirado, foi chiada a previsão do tempo: "Amanhã faz um tempo firme e bom com sol na região...". Bom para quem? - pensava Zé da Foice, como era conhecido o "hôme" que suspendia e depositava o copo de cerveja na mesa de bar - Para mim esse sol vai é acabar com minha lavoura, já faz meses que não chove e o tempo de colheita está chegando...

A pequenina televisão da cozinha da casa dos Souza falava alto o jornal do almoço, enquanto Rosilene, a empregada da família, terminava de preparar a comida: "Amanhã faz um tempo firme e bom com sol na região...". Bom para quem? - pensava a empregada cozinheira - Com esse ar seco entra pó o dia inteiro nessa casa e "dá-le" trabalho! Oh, canseira! Sem contar a tosseira que dá nas crianças e os espirros de que meu nariz reclama...

Na sala separada da cozinha por um balcão-mesa com quatro cadeiras altas, Léozinho brincava com seu carrinho e ouvia a panela de pressão que assobiava acompanhando a televisão branca que mais parecia um rádio reclamando: "Amanhã faz um tempo firme e bom com sol na região...". Bom para quem? Para mim! - sorria o menino gordinho - Amanhã será dia de piscina ou de futebol na escola!...

No eterno espaço vazio, invisível e imcompreensível do Céu, ouvia Deus as conversas do mundo e dos livres e entre eles as boas e velhas notícias não tão novas assim: "Amanhã faz um tempo firme e bom com sol na região...". Bom, muito bom... - pensava o Criador dos céus e da terra que ao fim de dias viu que tudo o que fizera era bom e então descansou - Espero que saibam compartilhar suas liberdades, proteger os desfavorecidos e não se fechar em suas rotinas: chorar com os que choram e se alegrar com os que se alegram. Tempo bom para quem? Para aqueles que souberem viver independentes do tempo...


Ao meu amigo Vinícius Bueno;
Que Deus o abençoe e que tu não te prendas ao tempo, mas que vivas Sem-Tempo... Viva uma Vida Eterna!

Gratis i Kristus

Não se indigne, mas leia!

Li hoje uma entrevista que a revista Carta Capital fez com um homem que por sua integridade, caráter e sequidão de ironia no rio que liga o território das ideias ao território das práticas, é dos mais admiráveis que conheci, o pastor Ricardo Gondim. Muito provavelmente (eufemismo para substituir "com absoluta certeza"), um dos tópicos da entrevista chamará atenção e chocará leitores evangélicos. Sobre este ponto, gostaria de discorrer...

Em uma cidade do interior de Minas Gerais, um homenzinho franzino, negro, com um sério problema de miopia e a perna esquerda um tanto quanto bem torta, era escritor e colunista do jornaleco da região. Por sua rara habilidade de manusear os signos linguísticos e pela falta de jornalistas, escrevia quase todos os dias em colunas diferentes da imprensa local, mais precisamente às terças, quartas, quintas, sextas e domingos, pois segunda era dia de falar de futebol e sábado das festas e rodeios da região.

Vilson, que é o nome do nosso escritor, era socialista e tinha também como ideal a luta pelos direitos dos negros, ou afrodescendentes, como preferia chamar. Teve uma vida complicada, difícil, de trabalho árduo na lavoura e pobreza na família. Sua mãe foi boa gente, uma afrodescendente de quatro "pês" (pobre, preta e de pretensa periferia) como Vilson costumava com leve humor brincar, e incentivou seu menino a estudar e ser "sabido de letras". Esse nosso Machado menos famoso não chegou a conhecer o pai que, um pouco antes da vinda do filho ao mundo, morreu acometido de cirrose, pois era um homem muito apegado ao canavial e aos produtos da cana.

Certo dia, confiando na fidelidade e boa compreensão de seus leitores, Vilson despretenciou um texto em que dizia que o preconceito e os problemas sociais não estavam na exterioridade, mas nos corações. Então abriu mão de leis que defendessem os negros, obrigações judiciais de patrões aos empregados e de batalhas por direitos. Experimentou novas palavras, degustou um belo texto e apresentou um lindo prato de lentilhas, entregando conscientemente a sua primogenitura, o seu dom, aos demais irmãos. Buscou aprofundar as relações e tirar do fundo da alma o que de fato transformava o mundo.

No dia seguinte, foi para a redação. Ela esta estava fechada, as portas lacradas e as paredes pixadas. Intrigado, tomou o caminho de volta para casa. Seus irmãos ao passarem por ele cuspiam no chão, abriam vozes destruidoras e cantavam palavrões. Um coral de maledicências. Mas por que? O que fizera? Apenas disse o que sempre tinha dito de modo direto! Todos se indignaram, esqueceram da história de Vilson, de sua integridade, da meninice pobre, da cor da pele, dos ideais, dos textos anteriores, da religião, do amor, da luta e de tudo! Não importa! Ele disse que as lutas não valem nada!... Opa! Espera aí! Vilson não disse isso, não desistiu das críticas e das transformações, somente aprofundou a reflexão, fez com que todos enxergassem o que já estava na frente dos olhos! Mas não importa. Ninguém lê o que o autor escreve, todos lêem aquilo que lhes apraz...

A maldade está nos olhos de quem lê e a bondade na boca daquele que degusta as palavras. "Tudo o que disseres será usado contra ti" não é dito por quem quer justiça, mas pelo cego que acha que vê. E o míope escritor negro e franzino foi o único que viu claramente a justiça! Pretensos homens de bem, não enxergam o outro e somente vêem o que lhes convém! Talvez seja por isso que somos convidados a ver o mundo pelos olhos da fé...

Ao ler, tenhamos como parâmetro o contexto da vida, o coração daquele que escreve e o texto que se lê. Não leiamos com os olhos, apenas o que queremos e com o egoísmo que ninguém vê, escondido atrás de colunas de pureza, moralidade e razão, mas com os Olhos da Fé. A maldade está nos olhos de quem lê e a bondade na boca daquele que degusta as palavras.

Gratis i Kristus

domingo, 17 de abril de 2011

Gênesis 28: 16

Passadas horas de atraso da locomotiva que vinha de Minguelim e ia em direção à costa Oeste, Estêvão deu seu primeiro suspiro e ajeitou o tronco para frente, desencostando do banco de madeira escura que ficava junto à parede vermelha, próximo à porta da pequena estação cidade de Laguinhos. Apesar da aparente postura de tranquilidade, fazia tempo que não ficava tão ansioso. Retornaria para casa depois de dois meses de estudos e pesquisas sobre certos tipos de plantas que existem apenas na região daquela cidade do interior. Seria possível que estas fossem remédio para cura de vários tipos de doença. Um prato cheio para um biólogo. Um prato cheio para Estêvão.

Sentia muita saudade de sua mulher, a bela Lúcia, que a pouco tempo depositara no anelar uma aliança dourada após uma longa cerimônia cristã. Apesar do marido não ser muito religioso e o fervor da esposa chamado de "não-praticante", fora um belo evento na Igreja Matriz. Sentia falta de suas conversas com primo Ângelo, matemático aplicado e fissurado por Euller, que também propunha uma fórmula matemática para explicar Deus. Fazia tempo que não conversava com Ferdinando, cabeleireiro italiano de esquina que lia muita filosofia e tinha interessantes sacadas intelectuais. Como faz falta a casa da gente! Como faz falta abrir mão de nós mesmos para termo-nos com outros. É uma ponte muito estranha essa que que se constrói entre o frio na barriga, a saudade e a esperança.

De tão concentrado em controlar sua ansiedade, Estêvão nem viu o velho bilheteiro se aproximar. Um velhinho simpático, de óculos redondo, nariz alongado, um cap azul escuro e uma farda de funcionário ferroviário adornada com botões dourados de número um pouco maior que o tamanho de seu corpo. Já se aproximava da quarta hora da tarde, horário que todo bilheteiro que se prese dá uma saída do trabalho para esticar as pernas. É que a bilheteria é muito reservada e depois de certa hora do dia cala-se de vez, esquecendo de seu relacionamento diário com os bilheteiros. Enquanto puxava dedo por dedo da luva branca da mão esquerda, admirando o reflexo nos trilhos causado pela queda que o Sol dá quando avisa de sua partida, o velhinho deu um suspiro e disse:

- Ah, como Deus é bom. Faz tudo tão perfeito que este mesmo Sol, nesta mesma hora do dia, em todos os dias, ande até certo ponto e me dê esta paisagem divina, maravilhosa...

- Como?! - perguntou Estêvão interessado em ensinar ao velhinho toda sua biologia-matemática-filosófica - Meu senhor, todos os dias é a Terra que gira em torno do Sol. E mesmo que tenha sido Deus que os tenha feito, não foi bem para o senhor, mas para tudo. Aliás, não é bem uma "paisagem divina dada para ti", pois enquanto que para um velho bilheteiro da cidade de Laguinhos é bom, para algumas plantas no Outono é causa de morte, para alguns pobres sedentos é motivo de desespero e para mim é catalisador de ansiedades.

O velhinho balançou a cabeça positivamente e guardou a luva esquerda no bolso traseiro da calça azul escura. Calmamente, passou a mão desluvada no queixo com um ar surpreso e em seguida começou a tirar a luva branca da direita:

- Muito interessante isso que me falas, filho. Enquanto muitos explicam tudo sem nem percebê-lo, tive uma experiência de fé antes mesmo de saber como tudo é. Eu sempre vivi antes mesmo de saber que era vivo. Muitos procuram com as próprias pernas encontrar Deus. Caminham pelo mundo, invadem as menores cavernas, descobrem os maiores tesouros, pegam trens, voltam para casa, reencontram amigos e a fé ainda parece muito distante. Deus está aí, rapaz! Talvez não controle o Sol, nem a Terra, nem a mim e nem ao sedento, mas Sua face está estampada nesse quadro. Talvez tanta dor, tanta morte, tanta ansiedade e tanto desespero, haja porque não se vê que Deus está aqui, debaixo dos meus pés. Também está ali depois daqueles trilhos. E está no céu, está no Sol, nos trens e na tua casa, na esperança daquele que ama. Vá em paz, jovem. E que Deus esteja contigo em sua viagem.



Gratis i Kristus

quinta-feira, 7 de abril de 2011

13 pessoas morreram por isso...

7 de Abril de 2011.

Um jovem entra numa escola e dispara contra alunos e professores...

Que dia cinzento! Apesar do sol e do bom tempo, da brisa vinda da praia, do comum trânsito de todos os dias e das rotineiras práticas do acordar, este dia seria cinzento. Não por causa dos prédios, da fumaça dos ônibus e caminhões, das nuvens de chuva ou do uniforme de alguns policiais. O dia seria cinzento porque mais uma vez a vida não se apresentaria como preta ou branca. Uma gama de tons sempre esquecidos e desapercebidos, lembraram-nos de longos períodos de silêncio e pesadas respirações. Como é incômodo o silêncio! Como são insuportáveis as pesadas respirações. Um homem acordou angustiado, arrastou o corpo e lembrou-nos de longos períodos de silêncio e pesadas respirações.

Que tamanha angústia seria capaz de guiar a morte nas as mãos desajeitadas e trêmulas de um jovem? Ou será que foi um abismo de egoísmo que encheu de temeridade e fúria o coração de um desconhecido? Como é possível que tamanha frieza acumule-se em um corpo humano de sangue quente e brilhe os olhos de terror? Qual fora a maldade que sofrera durante a vida e que o tornara capaz de perder a própria alma dentro de si? Criminoso infiel ou inocente parvo? Lembrei-me de que a vida não é e nem nunca foi preta e branca. O dia hoje foi acinzentado.

Quando criança, Tom, como era conhecido entre os amigos da escola, acordou de madrugada. Uma barulheira danada vinha da sala-cozinha de seu casebre na Zona Oeste do Rio. Naquela noite tenebrosa, pela fresta da porta do quarto onde dormia com seus 4 irmãos, viu seu pai em casa bêbado abusando de sua mãe. A pobre senhora negra e baixinha com um dos olhos roxo, cortes e arranhões no braço e sangue escorrendo pelo canto da boca, sofria nas mãos e no corpo de seu covarde e temeroso marido. Um homem de barba mal feita, feitio desgastado, sumido que apenas vez por outra aparecia em casa, que por sinal não era a única que visitava desta maneira. O menino Tom guardara para si seu primeiro grande medo. Junto ao medo, sempre é plantada a semente da vingança, que não brota, mas cresce debaixo da terra, e quando germina, germina tudo de uma vez, sai de dentro do terreno uma árvore formada logo que algo lhe permite respirar. O perigoso destas árvores é que podem crescer tanto, que saem do fundo do coração e cobrem os olhos. O vingador já não age mais por si, é a árvore que cria vida e domina por inteiro suas ações. O menino Tom, a criança Tom, ainda veria muitas vezes esta cena, ainda apanharia daquela figura paterna alcoolizada, sofreria nas mãos de colegas, seria traído por quem amava, perderia seus desejos, não criaria mais sonhos, morreria antes mesmo de perder a vida. A criança Tom descobriria o cinza da vida. Encontraria refúgio em filmes violentos e músicas que pedem alguma ação! Perderia o controle de si, deixaria que a árvore cobrisse seus olhos... 13 pessoas morreram por isso...

Ou quando criança, o menino Li, como era chamado pela mãe e os irmãos, tinha um gênio difícil. Descobriu a delícia de trazer os prazeres para si. Li conheceu o gosto do egoísmo, sentia-se o maior centro que o mundo já tivera, o maior umbigo que o mundo já viu. Sua vida valia mais que tudo e os outros não seriam nada além de meros mortais. Nem seus irmãos, nem seus pais, nem ninguém, nem todos... Para Li o importante era ele, era o eu. Porque os outros e não a mim? Embriagou-se de egoísmo. A pior das bebidas para tornar-se viciado é o egoísmo. Este, além de torná-lo alcoolatra, nunca o permitirá tratá-lo com grupos anônimos, não existem Egoístas Anônimos. Você sempre será e deverá ser o destaque, o nome em pauta. Pois bem, não era o caso de Li. Seu nome era pauta em casa, mimado e amado, no colégio, pentelho e folgado, na rua, traficantezinho mal-criado. Mas não era suficiente, seu egoísmo ainda não tinha sido saciado. Jamais o seria, pois egoísmos são surdos que falam mais que a boca. Encheu-se do egoísmo, encheu-se do mal. Os olhos fumegaram de raiva! Seu ego começou a berrar! Em tiros silenciou o ego, e logo depois começou a chorar... Covarde! Não suportou o sangue que derramara... Ou então, para que seu ego fosse saciado, deveria ser o nome de Li falado em todos os jornais... 13 pessoas morreram por isso...

Talvez doença, psicopatia, trauma de infância, maldade pura! 13 pessoas pagaram por isso. Wellington por causa deste incompreensível matou. Wellington lembrou-nos que a vida não é preto e branco. O mundo não é preto e branco. Tudo é muito confuso, tudo está muito acinzentado! Alguns culpam a ele, outros culpam ao sistema, à sociedade, à Deus ou ao Diabo. Não importa! O mundo continua acinzentado! Nossas vidas embaçadas, nossa dor compartilhada e a fala silenciada. Quem o culpa eu entendo, quem responsabiliza o sistema eu também estou do lado, tenho pena quem dá o crédito ao Diabo e muito me assusta e preocupa quem diz que Deus tem o controle, um propósito, que Deus é responsável. Não importa! O mundo continua acizentado! Escrevi, escrevi e escrevi e não consigo mais parar... Minha boca cala, e meu coração está cheio. Tudo para ver que é imconpreensível! Hoje, 13 pessoas morreram por isso...


Gratis i Kristus

quarta-feira, 6 de abril de 2011

No Psicólogo

A luz baixa na saleta de chão esverdeado destacava uma figura interessante sentada em um sofá um tanto confortável. O sofá, porque o figura não sentia-se muito confortável, nem um pouco a vontade. Tremia a perna direita num silêncio comedor de palavras. Foi quando ouviu de um outro não muito destacado sentado depois da mesa de madeira pintada de branco: "Podes começar, dize-me...". A figura assustada reclinou a cabeça, fechou os olhos, respirou fundo e desatou a falar. Contou de sua conturbada infância quando morava num prédio acinzentado na zona sul de São Paulo, seus dois gatos pretos e o papagaio João, este, presente da vizinha negra do apartamento 62 que jogava búzios e tarô. Isso sem contar no trabalho não divulgado de amarrações para o amor (com pagamento mediante a resultados). Declarou ter medo do escuro desde que se conhece por gente e que até hoje, depois que sua mulher dorme, levanta-se e acende a luz do banheiro no corredor. No dia seguinte culpa o "sonambulismo" que não tem. Sua mulher inclusive que não é bem mulher... Não que seja homem, jamais... É que não é de papel passado sabe? Aliás, naquele corpo feminino nada tem de passado...

Relembrou também das tristes experiências religiosas pelas quais passou. Fora católico quando criança, batizado e crismado, metaleiro adorador de Ozzy Ousborne na adolescência, budista na faculdade e vez por outra mudava para religiões jamaicanas adeptas à ervas contemplativas nesse mesmo período. Passou um tempo ateu na juventude boa e decidiu tornar-se evangélico quando conheceu a bela moça com quem é "casado". Desde então mantém a mesma profissão de fé, apesar de sempre ser assolado por dificuldades, crises e demônios que grudam eu seu encalço. Pois bem! Poderia ser este seu problema: os demônios! Seria possível? Com certeza... Até provável... Mas como derrotar estes seres? E se não forem eles? O que é bastante provável também... O que fazer?

- O que achas? O que devo fazer? perguntou o figura recuperando o fôlego respirando fundo novamente (ou profundamente...).

- Dize-me.

- O que?

- Dize-me...

- Dizer-te o que? Acho que já disse tudo! A menos que... Sim! Devo dizer-te de meus fantasmas psicológicos, minhas sombras do passado, tentar encontrar uma raiva reprimida ou algo assim. Ou quem sabe deva contar-te os segredos das mentiras que contei e não me fazem bem até hoje. Pode ser também que deva dizer-te meus sonhos, meus anseios, meus desejos certo? Até aqueles vestidos de muita terra dentro de meu subconsciente. Dizer-te minhas psicopatias e anomalias, minhas esquisofrenias os defeitos do psiquismo... É isso?

- Não. Dize-me!

- Dizer-te o que, Santo Cristo?!

- Não! Di-zi-me!

- Ah! Sim! Porque não disses-te antes? Devo dizimar estes problemas! Aniquilá-los! Derrotar meus monstros internos! Estas feras não me deixam dormir, trazem problemas para casa e para a cama, tanto com o travesseiro quanto com a minha mulher... Mas este é um outro problema, devo dize-lo a tu ou dizimá-lo antes mesmo? Aliás, como devo dizimá-lo? Com tapas? Pensamento positivo? Livros de auto-ajuda? A Bíblia? Oração...

- Não! Dizime, homem de Deus! Dizime! Não (a)creditas em Deus? Dê tua parte e entregue esses caminhos ao Senhor! Tudo mais ele fará... Olhe, a nossa conta corrente está nesse cartão e se preferires também aceitamos dinheiro ou cartão de crédito. Apenas tenha fé e (a)credites em Deus. Dizime!

- Ah pastor... Se é assim, acho que é melhor pagar e ir no psicólogo...


Gratis i Kristus