segunda-feira, 2 de abril de 2012

Silêncio! Deus é.

Provérbios 25: 2 - "A glória de Deus é ocultar certas coisas; tentar descobri-las é a glória dos reis."

Lewis Carroll é o autor de Alice no País das Maravilhas e Alice no País do Espelho. Mas, na verdade, esse não era seu nome. Lewis Carroll chamava-se realmente Charles Lutwidge Dodgson. Charles criou um pseudônimo: Lewis. Pseudônimo é mais ou menos um nome que, na verdade, não é nome, pois não remete à uma pessoa, mas à uma pessoa que uma pessoa inventou.

Em seu segundo livro, Charles, ou Lewis, não sei, conta uma estória em que Alice encontra-se com Humpty Dumpty; uma personagem que dá para as palavras o significado que ele quiser. Em certo momento da conversa, Humpty Dumpty utiliza a palavra "glória", num contexto que nada teria a ver com seu significado. Alice fica curiosa e pergunta à Humpty o que ele queria dizer com "glória", e ele responde que para ele significava um "argumento irretorquível". Mas teria ele o direito de fazer isso? Como poderia dizer algo que não era o mesmo para as pessoas? Assim perguntava Alice. Em resposta, a outra personagem diz: "A questão não é essa! A questão é quem é que manda aqui. Só isso." - seriam as palavras nos falantes, ou os falantes nas palavras? Quem é que manda? Isso, Humpty disse sobre glória. E o que ele diria sobre Deus?

Escolhemos um nome para Deus: Deus. Porém, esse nome era grande demais; precisávamos especificar mais coisas sobre Deus. Demos, então, novos nomes para Deus: protetor, amoroso, misericordioso, bom, justo, eterno, Insondável, inefável, santo, digno, Senhor, salvador, rocha, rei, libertador... E quantos atributos seremos capazes de a Ele empregar. "Atributos", os nomes de Deus. Construímos para Deus um castelo de pseudônimos, assim como o de Charles: nomes que não são Deus, não definem nem limitam e nem estão ligados ao próprio Deus, mas, de alguma forma, estão ligados à Deus. A glória de Deus foi esconder, a nossa, dos "reis", é descobrir...

Mas, assim como Humpty Dumpty faz com as palavras, que significados damos aos nomes que atribuímos à Deus? O que fazemos com essas palavras? São elas que "mandam" em nossas conversas e nossas orações, ou somos nós que utilizamos delas para falar o que experimentamos de Deus? Ao que me parece, algumas dessas palavras ganharam vida, deixaram de ser pseudônimos e tornaram-se seres com vida própria. Algumas palavras abandonaram as letras e se tornaram, para nós, literais, reais. Os dragões, as fadas e as princesas saíram dos contos para viver em nossa pseudorealidade de reis - nossa pseudorealidade "real".

Atribuímos à Deus, por exemplo, "Senhor", uma palavra que significaria nossa experiência de Fé da presença e liderança divina em nossa vida. Porém,  ela ganhou vida própria e tornou-se um dragão, fez-se um conceito: Senhor passou a ser uma entidade (ir)real que controla e domina tudo. Deus tornou-se déspota e nossa experiência viva foi transformada em lei - palavras com vida própria. Deus passou a ter o controle de tudo. Se alguém morre, está no controle de Deus. Se alguém vive, foi graças à Deus! Se uma pessoa nem morre nem vive... Deve ser diabólico...

A palavra quando ganhou vida nos aprisionou em seu mundo real. Nos tornamos reis descobridores destronados e desistentes. Nada mais descobrimos, nada de real temos. Uma Majestade nada majestosa. Precisamos, para nos libertar, abandonar a lei da palavra e buscar uma nova experiência de Fé, uma nova significação.  (Re)Descobrimos a Graça. Maravilhosa Graça! Nos soltamos, relaxamos e determinamos os novos passos... Determinamos? Sim, elegemos um novo nome, um novo atributo, uma nova cadeia, um novo monstro que saiu dos livros e ganhou vida própria. Charles realmente se tornou Lewis...

Nós, reis que fazem de seus sonhos reais, encaixotamos novamente Deus. Decidimos que, de agora em diante, Deus não controla mais nada. Pois bem, toda e qualquer experiência de Fé que fugir do "controle" da Graça, deve ser rejeitada e enclausurada, pois vai contra nosso  último atributo eleito. Quais serão os argumentos que os defenderão? Que significado daremos para as palavras? O que faremos com "glória"? E com "Deus"? Em Humpty Dumpty está, talvez, a nossa salvação: "A questão é quem é que manda aqui. Só isso."

Pode ser que numa mesma situação, num mesmo dia, envolvendo as mesmas vidas, Deus esteja no controle e não. Pode ser que num mesmo momento, Deus seja gracioso e não. Pode ser que numa noite escura, eu durma em paz ou não. As experiências da vida não são feitas com argumentos, são feitas de vida. As experiências de Fé não são feitas de palavras, mas de Deus. Quem disse que Ele cabe em meu vocabulário? Quem disse que há um nome que o defina? Quem disse que um pseudônimo é suficiente? Um atributo? Não! Deus se experimenta e se faz na Vida. Sabe o que acontece? Deus se encarna...

O nome não é Jesus, é Messias. Aliás, não é Messias, é Cristo. Desculpe-me, é Filho de Deus. Não, Filho do Homem... Não! É Vida! É Deus que se faz vivo, se faz presente, se expressa e manifesta de modos indescritíveis, incompreensíveis, invisíveis, inaudíveis, milagrosos. É o Deus que não se sonha, se encarna. Os reis descobridores o descobrem enquanto reis, enquanto vivos, enquanto reais. Deus esconde, Deus oculta. É eterno. Da eternidade não se fala. De Deus não se fala. O nome nem deve ser escrito! Porque Deus é o Princípio, é o Fim, Alfa, Ômega, Verbo, Amor, Espírito, Liberdade... Deus é! Deus somente é...

Não vale a palavra certa, o nome certo ou a doutrina certa. A Vida é única, a experiência de Fé é silenciosa, experimentada. Quem é capaz de desvendar e compreender Deus? Quem diz do mistério? Quem crê ser capaz de esgotar o oculto? Silêncio! Silêncio! Silêncio! Ouço barulho demais, ouço nomes demais.

Deus é.

Deus.

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Gratis i Kristus

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