domingo, 18 de outubro de 2009

Eu, o Super-homem, Nietzsche e Deus

Se você gosta de quadrinhos, quando ouve o nome Super-homem lembra automaticamente do herói das revistinhas, filmes e seriados de televisão. Já se você é mais chegado a filosofia, lembra-se de Friedrich Nietzsche e sua metáfora do Super-homem, no livro "Assim falou Zaratustra". E se você é como eu, relembra-se dos dois. Nas histórias em quadrinhos, o Super-homem é um extra-terrestre de forma humana que tem uma força sobre humana, voa, possui visão de calor e uma incrível velocidade. Nossos olhos brilham e a imaginação vai longe ao visualizarmos as cenas, possibilidades e situações que desafiam a física e inspiram lampejos heróicos em nossas vidas. Por alguma razão, não é muito diferente de quando lemos Nietzsche, e é nessa mesa que quero cear e analisar o Super-homem.

Principalmente por ter nascido em um berço cristão, durante toda a minha vida ouvi críticas (mesmo que rápidas e seguidas de uma súbita mudança de assunto) a filosofia pós-moderna de Friedrich Nietzsche. "Ele era louco...", "Um depressivo...", "Desencantado...", e claro, "Quase o próprio anticristo...". Essas frases permeavam as efêmeras conversas e discursos que ouvia sobre este pensador e seus pensamentos. Cresci e comecei a conhecer mais deste obscuro ser e seu perfil.

Depois de entrar na faculdade, ler mais, ter acesso a comentários diversos sobre o "amor a sabedoria" e um processo diferenciado na minha formação cristã (o fim do não oficial INDEX evangélico e a possibilidade de estudar, trabalhar e incentivar meus conhecimentos) encontrei-me com o Super-homem niestzsheano. Ouvi a respeito de uma utopia de Nietzsche, um devaneio, aliás, apenas um devaneio, uma crítica social, crítica religiosa e crítica a própria mente de Nietzsche, todas indagações e análises sobre o Super-homem de Nietzsche. Para falar melhor desta caricatura ou personagem, peço licença ao meu amigo Friedrich (que Deus o tenha) e àqueles que obtém os direitos autorais dos textos de Nietzsche (se é que existe essa possibilidade ainda, já que é um patrimônio da humanidade) para citar partes do trecho de apresentação de nosso herói:

"Eu vos anuncio o Super-homem... Que é o macaco para o homem? Uma zombaria ou uma dolorosa vergonha.
Pois é o mesmo que deve ser o homem para o Super-homem: um irrisão ou uma dolorosa vergonha.
Percorrestes o caminho que medeia o verme ao homem, e ainda em vós resta muito do verme. Noutro tempo fostes macacos, e hoje o homem é ainda mais macaco que todos os macacos...
Eu vos apresento o Super-homem! O Super-homem é o sentido da terra...
A hora que digais: 'Que importa minha felicidade! É pobreza, imundície e conformidade lastimosa. A minha felicidade, porém, deveria justificar a própria existência!'...
A hora em que digais: 'Que importa minha justiça?! Não vejo que eu seja fogo e carvão! O justo, porém, é fogo e carvão!'...
O que é de grande valor no homem é que ele seja uma ponte e não um fim; o que se pode amar no homem é ele ser uma passagem e um ocaso.
Eu só amo aqueles que sabem viver se extinguindo, porque são esses os que atravessam de um lado para outro lado...
Amo os que não procuram por detrás das estrelas uma razão para sucumbir e oferecer-se em sacrifício, mas se sacrificam pela terra, para que a terra pertença um dia ao Super-homem.
Amo o que vive para conhecer, e que quer conhecer, para que um dia viva o Super-homem...
Amo o que não reserva para si uma gota de seu espírito, mas quer ser inteiramente o espírito de sua virtude, porque assim atravessa a ponte como espírito.
Amo o que faz da sua virtude a sua tendência e o seu destino, pois assim, por sua virtude, quererá viver ainda e não viver mais...
Amo o que prodigaliza sua alma, o que não quer receber agradecimentos nem restitui, porque dá sempre e não quer se poupar...
Amo o que justifica os homens vindouros e redime os passados, porque quer sucumbir ante os presentes...
Amo aquele cuja alma é profunda, mesmo quando ferida, e pode ser aniquilada por um leve acidente, porque assim de bom grado passará a ponte.
Amo aquele cuja alma transborda, a ponto de se esquecer de si mesmo, e todas as coisas estão nele, porque assim todas as coisas se farão para seu ocaso.
Amo o que tem espírito e coração livres, porque assim sua cabeça apenas serve de entranhas ao seu coração, mas o seu coração o leva a sucumbir.
Amo todos os que são como gotas pesadas que caem uma a uma da nuvem escura suspensa sobre os homens; anunciam o relâmpago próximo e perecem como anunciadores.
Vede: eu sou um anunciador do raio e uma pesada gota procedente da nuvem; mas esse raio chama-se Super-homem."

Fantástica a imagem do Super-homem nietzscheano. Não entendo o porque do medo cristão desta figura magnífica. Assim como não entendo também a mitificação filosófica deste ser. Paremos para pensar; a análise de Nietzsche e sua figura do Super-homem não é nada além da caricatura do "Ser Humano". Todas as prerrogativas e anseios, assim como atitudes características deste Super-homem, são próprias e percebidas como de um ser humano. A diferença é que Nietzsche distingue entre o humano e o homem. Separa a relação muitas vezes vista como intrínscica entre o homo sapiens e o humano. Nietzshce socorre das prerrogativas humanas e as coloca num patamar acima das animais, ou animalescas, sem ao menos citar estas. O Super-homem é o puro homem (no sentido de ser humano, pertencente e participante de sua humanidade).

Creio que a aversão religiosa a esta filosofia seja porque ela critica não apenas a instituição e os dogmas, mas inteligentemente e com brilhantismo a relação do homem com Deus ou divindade e a própria existência Deste. Entretanto, na minha fé, percebo que meu amigo Friedrich (que Deus o tenha) cegou-se ou foi cegado da maior pregação ou mensagem do Evangelho, a boa nova de sermos imitadores ou parecidos com Cristo. Jesus de Nazaré, que para mim a plena revelação de Deus, e para outros simples filho de pai desconhecido de uma cidadezinha microscópica do interior de uma nação que nem nação era direito, foi e agiu como o mais puro ser humano. Sua marca e diferença foi sua humanidade, exercida com plenitude e maestria.

Logo, se meu objetivo é ser mais parecido com Cristo, meu objetivo é ser mais humano. Investindo mais na lógica, se Jesus é a plena revelação de Deus, quanto mais humano eu sou, maior minha sintonia com Deus. Quanto mais humano, mais me aproximo da Imago Dei, a boa e velha imagem e semelhança de Deus. Quanto mais simples e puro for em minha humanidade, mais Super-homem sou, mais Cristo sou, mais próximo de Deus estou, mais "Já não sou eu quem vive, mas Cristo vive em mim".

13 comentários:

  1. "Uma cidadezinha microscópica" FOI DEMAIS, argumentos cristãos desprezivéis!! Jesus serviu para ensinar aos homens que devem se alimentar de bananas!

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  2. Perdi me tempo lendo isto. affz.
    Vá estudar meu garoto! Nietzsche, Übermensch, Super-Homem (Sieger)... lol

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  3. super-homem de quadrinhos????
    Cara creio q vc tenha uma visão distorcida do que realmente seja o super-homem nietzscheano.
    Se puder faça uma relação com o homem-idéia da Dostoiévski (literato Russo)

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  4. Olá queridos amigos Anônimos,

    Cansei de responder mensagens e e-mails a leitores que não me conhecem ou entendem o que pretendi com este texto, provavelmente por terem sido doutrinados (e bem doutrinados) pelo tradicionalismo de leitura filosófico que gera manuais e desprezo pelo todo. Não que vocês necessariamente fazem parte deste grupo, mas para evitar a chatisse de sempre ter que responder as mesmas coisas e ouvir um "ah... entendi! Não concordo muito, mas entendi...", vão aqui as respostas aos vossos comentários (o que praticamente nunca faço, responder comentários, nem os elogios) e já um pano de fundo para os proximos que comentarem.

    Primeiro: Eu não me propus com este texto criar um tratado filosófico, foi uma releitura para diminuir um abismo entre o cristianismo e Nietzsche (um abismo criado por pelo cristianismo, não por Nietzsche).

    Segundo: Não li Nietzche em manual e não me diverti com um ou dois trechos do autor. Escrevo enxergando sua obra completa, como um todo. Analisando Zaratustra, fiz um tipo de leitura, li então Ecce Homo para ver se compreendia a relação de Nietzsche com a obra. Completei a leitura para tentar me aproximar da cabeça dele quando falava do cristianismo lendo o Anticristo, sua crítica ao imaginário religioso e à filosofia moderna no Para Além do Bem e do Mal e, em todos estes textos percebi e tirei uma leitura diferente da comum (talvez senso-comum) da relação Nietzsche/Cristianismo. Trabalhei com esta leitura na faculdade, a defendi e foi (mesmo a contra-gosto) muitíssimo bem aceita.

    Terceiro: As analogias e comentários que faço são em sua maioria irônicos e comparações propositalmente simplórias.

    Quarto: Querido amigo Anônimo numero 1 - os argumentos cristãos foram tão desprezíveis que foram capazes de levá-lo a ler toda essa porcaria e ainda comentá-la. Como diz Nietzsche em Ecce Homo: "ataco somente coisas das quais se exclui qualquer antipatia pessoal... atacar para mim é para mim um sinal de benevolência... os cristãos mais convictos sempre me foram sobremodo dignos e benévolos." (cap. II, sub. 7, ultimo paragrafo).
    Amigo Anônimo numero 2 - O mesmo que para o nosso amigo anterior.
    Amigo Anônimo numero 3 - Como escrevi mais acima, fiz esta comparação de maneira bem tosca mesmo. Não, não considero o dos quadrinhos o mesmo que o Nietzscheano, apenas os comparei no quesito de serem ironicamente "sobrehumanos". Muito obrigado pela dica e comentário.

    Minha leitura está em aberto, claro, a vontade para debater e refletir sobre o que escrevi e sobre a leitura que vocês também fazem sobre Nietzsche, mas caso o queiram fazer, que façam baseados em algo e com explicações, ok?! Rompamos com o tradicionalismo filosófico e sempre busquemos algo novo. O escrevi ja faz um tempo, já alterei em mim mesmo algumas coisas que escrevi aqui e também alterarei mais à frente. Não neste texto, mas nos próximos. Para compreender a construção do meu pensamento.

    Grato,

    Inté menos

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  5. Bruno eu não partilho dos mesmos conceitos e leituras suas sobre Nietzsche mas eu te parabenizo pela coragem em escrever e estudar...é um processo. Os anônimos que te agridem são anônimos...são donos da verdade...olha que na academia conheço fundamentalistas nietzschianos que tal qual os profetas fundamentalistas citam sua obra em alemão, de cor e não admitem contradições...são absolutos e autoritários. abraço camarada.

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  6. Bruno, muito interessante o seu 'devaneio', rs.
    É realmente complicado fazer esta ponte entre os pensamentos de Nietzsche e o Cristianismo (vide os comentários a cima, hahaha. Faz parte!).
    Acredito que em "Assim falou Zaratustra", Nietzsche vai de encontro a alguns conceitos que, ao longo de muitos e muitos anos, foram criados de religiões como o Cristianismo. A "eterna espera" de um Messias - ocasionando, muitas vezes, na estagnação, imobilidade e mediocridade, é um exemplo disso.
    Enfim, continue elaborando seus textos e, o mais importante, expondo a sua opinião.
    Parabéns e boa sorte!
    Abraços.

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