segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Tive que escolher entre ganhar o mundo ou não perder o dia

Tive que escolher entre ganhar o mundo ou não perder o dia. Vi todas as galáxias e enxerguei o universo debaixo e de cima. Foram-me apresentados todos os reinos e seus reis, me propuseram poder e glória em troca de um nascer e pôr do Sol meus. Mas não enganei-me; dei a César o que é de César e a Deus o que é de Deus.

Me fizeram sonhar com anjos e seres sobrenaturais. Fui convidado para ter o dom de milagres, ter poder sobre demônios e o toque de Midas. Porém, vi um clarão. Fiquei cego para aquilo que não é real, deixei de lado todas as vãs práticas antigas e mudei meus objetivos de perseguir e aprisionar para difundir e libertar. Lembrei que nada faz sentido debaixo do Sol.

Convidaram-me para todos os banquetes, os gigantes banquetes. Todo tipo de comida - as sobras e as faltas. Prometeram-me tudo, todo o alimento em meu nome. Seria senhor do resultado do trabalho dos homens, da busca do trabalho dos homens. Entretanto, me recordei de que nem só de pão viverá o homem e de que a boa fome não é de comida, mas de justiça! O bom pão não é aquele que afasta o homem da morte, mas dá ao homem a Vida. Toda a comida em troca do meu pão-do-dia.

As chaves do mundo foram entregues na minha mão em troca da porta-do-meu-dia aberta, mas não pude aceitar. Ouvi o choro da criança, senti a dor do meu avô, vi a tristeza do meu irmão e passei a fome do meu vizinho. Pensei no trabalho e no suor sem sentido que os mortais fazem debaixo do Sol. De que adianta o homem ganhar o mundo e perder sua alma? Bateu forte meu coração contrito. Sou humano. Que eu seja como aquele que sendo Deus não quis ser igual a Deus, mas esvaziou-se de si e se fez como nós.

Um dia é sem sentido demais, sofrido demais, vivo demais para ser passível de indiferença. Talvez neste dia a criança sorria, meu avô descanse, meu irmão escreva uma poesia ou eu dê um prato cheio ao meu vizinho. Talvez eu salve o dia! Quem sabe neste dia o Reino de Deus se faça? A ressureição dos justos? Talvez o mundo seja salvo! Porque trocar este dia? Para que ganhar o mundo? Antes, vale mais aprender a contar os meus dias. Antes, vale mais buscar um sentido. Antes, vale mais viver uma vida boa, uma vida eterna, nem que seja por um dia. Tive que escolher ganhar o mundo ou não perder o dia. Fiquei com o meu nascer e pôr-do-sol.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

No meu tempo este texto era outro...

No meu tempo o mundo era outro... Os jovens tentavam saber viver e os velhos ensinavam a saber morrer. Quanto mais novo era-se cheio de vigor e sonhos, e quanto mais maduro cheio de sabedoria e serenidade. Não se confundia a vida com êxtase e nem a morte com depressão. O tempo não era nem lento e nem rápido, nem amigo nem inimigo. Era simplesmente necessário; era tempo. O eterno não era estático e nem o finito ruim. O mundo não era imbecil.

No meu tempo a mente era outra... Não se chamava ilusão de imaginação e nem fé de fuga do real. A razão não buscava ter certezas e nem a fé procurava soluções. No meu tempo a dúvida convivia bem com o crescimento, as incertezas impulsionavam nossos saltos e meros métodos não eram suficientes explicações. A fantasia fazia bem e o desejo não se tornava obsessão. As pessoas sabiam suas missões. A mente não nos enganava, era boa companheira.

No meu tempo o dinheiro era outro... Pessoas valiam mais que números e papéis, as trocas eram entre sobras e necessidades, os nomes e palavras valiam alguma coisa. A vida era mais valiosa do que as suas partes. A morte era tão respeitada que apenas os dignos a mereciam. O sofrimento quando sentido era curado por liberdade, não escravizado por sensações e aprisionado por objetos. No meu tempo  dinheiro era símbolo para a igualdade. O dinheiro não era dono de nada.

No meu tempo tudo parecia estar de cabeça para baixo... E meu tempo não faz tanto tempo, ou talvez faça tanto tempo, que ainda não me esqueci dele! Meu tempo só tem o tempo de vinte e um anos! Mas mesmo assim deu tempo para lembrar de um tempo que nunca vivi. Não conheci este tempo,  mas tenho lembranças dele, tanto que sonho e falo a todo tempo com esse tempo mesmo só tendo estado aqui...

Mito dos homens e das estrelas

"As estrelas são lindas, mas não podem participar ativamente de nada, só observar. Isso se deve a um castigo que receberam por alguma coisa que fizeram há tanto tempo que nenhuma delas sabe do que se trata."
(James Mathew Barrie, Peter Pan e Wendy)

Houve um tempo em que os homens não eram livres, viviam sob tutela e custódia do firmamento de cima, do amor das estrelas. Não havia nem dia nem noite, era tudo um tempo só. Por não serem livres os homens não tinham atos. Não dormiam nem acordavam, não comiam nem esfomeavam, não geravam vida nem matavam e não sumiam nem ficavam. As estrelas sim, estas eram ativas e sempre estavam lá olhando e velando os homens. Trabalhavam para manter a vida e se alimentavam de sua beleza. Quando descansavam brilhavam mais, quando trabalhavam brilhavam menos e sentiam fome.

Um dia uma estrela maior, querendo crescer ainda mais, decidiu parar de trabalhar para se alimentar. Com isso as outras estrelas tiveram que aumentar seu fardo de trabalho. Consequentemente cansaram-se mais também. O amor das estrelas pelos homens se esvaia. Logo uma a uma iam parando e fugindo para descansar e se alimentar de seu brilho. As maiores a princípio empurravam as menores de volta ao trabalho, mas logo estavam tão grandes e brilhantes que nada mais além de si viam. Enquanto fugiam, o firmamento de baixo escurecia...

Todas as estrelas fugiram para alimentar-se de si, cegaram-se por causa de seu brilho, e agora o firmamento de cima estava sem luz, e o debaixo em plena escuridão. Um buraco se abriu entre os homens. Estes não eram livres, não tinham atos e por isso não conseguiam se proteger. Estavam acorrentados pela escuridão. Surgiu o medo. As estrelas que eram ativas e responsáveis pelos homens não mantinham mais a vida. Os homens agora estavam encurralados pelo medo; presos à morte, mas não podiam morrer.

Ao ver o que acontecia, o Mentor se entristeceu. Não havia criado estrelas para viver para si, e nem homens para morrer sem perder a vida. Decidiu rever sua Peça. Em busca de salvar a vida, castigou os astros. Prendeu as estrelas no firmamento de cima, fixou-as distantes umas das outras e as obrigou a olhar, piscar mas nunca agir. Seriam tão belas quanto nunca, lindas! Mas presas a sua beleza, ao que fizeram com sua liberdade. Já para que os homens se libertassem do medo, foi-lhes dado o amor das estrelas. Com ele, vieram a responsabilidade, o trabalho, o brilho e o tempo. Dia e noite foram feitos. Dois lados de uma vida apresentados: o amor e o medo, o medo e o amor. Os homens agora conheciam a escuridão e conheciam o brilho. Eram livres e limitados por sua liberdade. Agora dormiam, acordavam, comiam, esfomeavam, geravam vida, matavam, sumiam e ficavam. As estrelas não. Não trabalhavam, não mantinham a vida e nem se alimentavam. Os homens tinham o medo e aquilo que afastava o medo. Poderiam viver e morrer. Eram livres... Devem manter a vida até que seu brilho os pare.

sábado, 19 de fevereiro de 2011

Enfim fui representado!

Assistam:

Deputada Cidinha Campos na Câmara dos Deputados do Rio de Janeiro.
Enfim fui representado. Enfim fomos representados!

http://www.youtube.com/watch?v=MRL-dvE0OzY




 

sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011

Sumiu quando cresci...

Conheci um cachorro que falava, Rodolfo, meu companheiro. Peregrinou comigo por florestas que pulsavam vida. Comemos frutos tão doces que faziam com que as abelhas não produzissem mais mel. Subimos altas montanhas, nos aventuramos por rochas flutuantes, saltamos entre as nuvens, nadamos em águas de cachoeiras que corriam pra cima e desvendamos cavernas e esconderijos enigmáticos. Trotamos com cavalos selvagens, conversamos com os macacos e choramos com elefantes. Descansamos em savanas que leões deitavam ao lado de cordeiros, em selvas que tigres jogavam com cobras e jumentos riam com jacarés.

Conheci o Paraíso quando criança; sem nem sair do meu quarto! Não tinha a certeza do amanhã e nem a dúvida de ontem. Ninguém sentia fome, a tristeza não era a vida, o riso não era necessidade e a sede era pelo novo, não só de água. O tempo era tão grande que o vazio não era percebido. A eternidade se fazia presente. Não é que a morte não fazia parte da vida, mas o Reino era tão grande que a morte não era o fim. A eternidade se fez presente. Pena que logo me fizeram (por inveja) comer um fruto que me roubou a vida, cegou os olhos e ensurdeceu meus ouvidos. Não vi mais Paraíso e Rodolfo não falava mais. Não há mais tempo! O último lugar onde quero estar agora é no meu quarto...

quinta-feira, 3 de fevereiro de 2011

Toque, marche e tenha consigo a esperança

Após uma apresentação da orquestra, com o anfiteatro já vazio e silencioso, apenas com as luzes do palco acesas, o jovem trompetista sentava-se só e cabisbaixo segurando em sua mão a maleta preta de seu instrumento. À esquerda do palco, o maestro despedia-se dos últimos elogios caros adornados com vestidos e peles e smokings e bengalas. Enquanto virava-se resmungando das triviais e evasivas conversas que nos protegem de elogios caros, viu o pequeno jovem balançando suas pernas suspensas alguns palmos do chão à beira do palco. Aproximou-se:

- Depois de uma bela noite, o que há, filho?

- Depois de uma bela noite, não sou lembrado por ninguém. Sou apenas o trompetista. Esforço-me, tiro os melhores sons de meu instrumento, corro contra as forças do trabalho e do tempo para continuar soprando minhas notas e ainda assim, sou engolido pelos outros e nunca lembrado, sempre esquecido. Sou apenas o trompetista!

O maestro com seus longos cabelos grisalhos e postura imponente, deu alguns passos frouxos em círculos. Parou, levantou os olhos para as galerias do anfiteatro e soltou conversas não triviais e nem um pouco evasivas:

- Quando nascemos nos dão uma trombeta e sandálias nas mãos seguidas com uma ordem: "Toque e marche!". Uns apenas tocam, outros apenas marcham. Uma parte ainda nem toca e nem marcha. Mas feliz aquele que entra na Terra Prometida! Lembre-se, são apenas sete voltas. Tocar e marchar até que os muros caiam, até que a cidade se abra e aviste a bela terra! E lembre-se, são apenas sete voltas. O que seria de Josué sem seus trombeteiros? Alias, o que vale mais? Ser lembrado como Moisés? Ou esquecido como o trombeteiro? Feliz aquele que entra na Terra Prometida!
Entretanto, tristes os que se esquecem do flautista. Feliz o flautista que não esqueceu a sua música, o que ela faz e quem ele é! Enquanto sua música levava embora os ratos e limpava as casas e as ruas, a cidade não se lembrava dele, apenas queria esquecer dos ratos. Porém, o flautista não se esqueceu de que era flautista, do que sua música era capaz. Quando então sua flauta leva consigo as crianças, a cidade cala, envelhece, morre. O novo, a esperança, o futuro estão nas mãos do flautista.
A grande sacada não está em ser lembrado pelos outros, mas em não esquecer-se de si. Não se esqueça de sua missão: "Toque e marche!". E lembre-se, são apenas sete voltas. A grande sacada não está em fazer algo com perfeição para que os outros te aplaudam, para seres herói! Mas sim, em fazer algo com perfeição para que tua vida valha a pena. O segredo da vida é: toque, marche e leve consigo tudo o que há de novo, esperançoso e dê sentido para o futuro da vida! Toque, marche, veja os muros da cidade ruírem e entre na bela terra cheio de esperança. São só sete voltas. Feliz aquele que entra na terra prometida...

terça-feira, 1 de fevereiro de 2011

Contar, Ouvir e Escrever

Apesar das estórias bíblicas serem milenares, datarem milênios antes de Cristo, foram escritas e compiladas apenas alguns séculos antes de Cristo. Como foram tão longe? O segredo e a graça da brincadeira estavam no ouvir. Por tradição oral, os mais velhos ensinavam para as crianças a língua, a religião e a cultura utilizando-se destas estórias. O grande segredo e a graça da brincadeira era o ouvir. Parar o corpo, aquietar a alma e deixar que as palavras ditas revelem aquilo que está oculto aos olhos.

Contar, ouvir e escrever estórias é o que fazemos todos os dias, é o que somos e é o que seremos. Alguém nos conta ou contou, nós ouvimos e passamos a assinar estas coisas de próprio punho. Se um dia Cristo nos conta sua estória, nós ouvimos e a escrevemos em nosso coração. Pois bem, esta é a caminhada que temos, a carreira que nos é proposta. Corramos com perseverança.

Para isto, é necessário que alguém nos conte algo e que nós ouçamos para então escrevermos em nós, com o nosso punho, este algo contado. Se somos capazes de escrevê-lo, também somos capazes de contá-lo. Nosso desafio é conseguir cumprir estes passos. Novamente, é necessário deixar que as estórias se contem a nós e nós possamos ouvi-las para tê-las conosco, podendo então escrever estas “leis” não em tábuas de pedra, mas em tábuas carne, em nossos corações.

Permita então que a Bíblia te conte as estórias, e não que você as procure e as tire de lá. Pois se isso acontecer, não são as estórias que se contam a você, mas você que sem tê-las ouvido, fala histórias. Cála-te! Não como um imperativo autoritário e maldoso, mas sim como um suspiro de “calma, meu coração”. Deixe que Deus te fale e te traga as novidades do Evangelho, da Palavra que se renova todos os dias, que nunca deixa de ser Palavra. Não podemos nós dar o valor à Palavra, mas ela que pode nos dar o Valor, o Valor Eterno. Portanto, para que possamos contar as estórias para as crianças sedentas por aventuras e novidades, antes precisamos ouvi-las e escrevê-las em nós. Não sou eu e não é você que dominamos a verdade e a falamos para crianças, mas é a Verdade que nos liberta e é livre com seu Espírito para soprar, assim como o vento, onde quer sem que alguém a controle e diga que será “por lá ou por aqui”.

Assim, nós não devemos dar o valor das estórias, não podemos criar nelas uma “lição de moral”. Apenas contemos estas estórias! Deixemos que elas se encantem e se marquem, sejam ouvidas e escritas na vida das pessoas. Não pela lição limitada, temporal e recortada de um excerto, mas pela Verdade Eterna, ilimitada, perfeita e libertadora para a qual apontam! Que possamos combater bem este combate. Que as estórias se contem e nós as ouçamos, que escrevamos em nossas vidas e que pessoas possam também escrevê-las ao ouvi-las contadas por si mesmas através de nós, de nossas vidas. Para contar é necessário ouvir aquilo que fora escrito. Para escrever é necessário ouvir aquilo que é contado. Para ouvir… Deixe que as estórias se contem…