segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Consolo e Esperança

Quando olhamos para a vida e dizemos "nem tudo foi ruim", encontramos consolo. Pelo menos é o que Richard Rorty propôs num debate sobre "consolação". Já quando olhamos para o futuro e desejamos algo diferente, melhor do que aquilo que vivemos, experimentamos esperança. O projeto para amanhã que independe do frio na barriga ou do coçar do coração, do sorriso no rosto ou de uma boa lembrança, chama-se esperança.

Para os dias de tempestade, o consolo é um bom abrigo. Para todos os dias, a esperança tem que ser o ar que respiramos. Consolo é uma possibilidade para suportarmos as dores, as perdas, os dias maus. Já esperança não é possibilidade, mas um dever. Devemos ser esperançosos sempre, podemos nos consolar quando preciso. Diferente do consolo, esperança não é nosso abrigo, mas a coragem que nos obriga a sair da caverna depois que o perigo passa. Redundantemente, ela tem que ser um dever. Diferente de uma sensação de paz e segurança, esperança é o se lançar para o desconhecido, o inseguro, o incerto, o escuro, um projeto.

O que seria amar senão se lançar no perigoso, jogar-se contra os leões confiando que eles não te atacarão, entregar-se nas mãos de um carrasco sem resistência na esperança de que ele não baixe o machado em nossa cabeça - apesar de poder fazê-lo? Amar não é entregar-se por inteiro, sem desconfiança e sem o medo de ser usado pela moça mais linda da face da terra? Ama quem se deita nos braços de alguém confiando que esses braços trarão carinho... Se temos esperança, é porque amamos, confiamos em algo ou alguém e sem certeza de que seremos acolhidos, acariciados, cuidados...

Soren Kierkegaard já escreveu: "Mas o amor, que é maior que a fé e que a esperança, se encarrega de construir a esperança". Só sabe viver a esperança quem sabe amar. Só vive a esperança aquele que ama. Amantes são esperançosos, se lançam para o desconhecido, sonham com o futuro, o pôr-do-sol e o nascer de outro dia (ao mesmo tempo). Tem que amar muito a vida para não se acostumar com casas, com luxo, com proteção constante. É esperança. "Amanhã será maior", "amanhã será melhor"! Por isso não ficarei aqui, escondido. Por isso nos lançamos nos braços uns dos outros. Por isso arriscamos abrir mão de tudo por amor, pelo amanhã de quem amamos.

E quando os dias são de tempestade, tristes, em que não temos força, encontramos aquele colo com pernas cruzadas no sofá que nos convida a reclinar a cabeça. Encontramos mãos que se entrelaçam por entre os fios de nossos cabelos costurando lembranças boas, fazendo um cobertor que nos aquece dizendo: "nem tudo é ruim, nem tudo é tão mau, olhe para o lado, olhe para mim". Encontramos consolo...

Mas, para além desse dia, para todos os dias de todos os amantes esperançosos, é o dever da esperança, a Lei do amor, que projeta, empurra, movimenta, ensina, traz novos ares, apresenta mudança, transforma o mundo. É a esperança que molda o desejo dos amantes para não viverem somente para si mesmos, mas para todos, para o amanhã, para os filhos que nunca viram e que talvez nunca virão. Só quem ama tem esperança. Só quem tem esperança sabe o que é se entregar para a incerteza do amanhã, para o nada, para um projeto que tem tudo para dar errado.

Como escreveu Slavoj Zizek ao ler as cartas de Paulo (e aqui termino): "Por essa razão o cristianismo é a antisabedoria: a sabedoria nos diz que o esforço é em vão, que tudo termina em caos, enquanto o cristianismo insiste insanamente no impossível. É óbvio que o amor, sobretudo na forma cristã, não é sábio". Somos loucos porque amamos, não somos sábios porque apostamos no amanhã antes mesmo que ele chegue. Temos esperança...






Gratis i Kristus


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