sexta-feira, 5 de março de 2010

(In)Certeza

O problema do prefixo "in(m)" da língua portuguesa, é que quando ligado a uma palavra, anula-a ou põe-na em uma situação constrangedora; a "situação do talvez". Indireto, impossível, inadequado, incerto... Isto! Incerto! As palavras com o prefixo "in(m)" tornam-se incertas! Que por sinal, é uma palavra com este prefixo.

A incerteza é causadora de problemas. "Ser ou não ser?", "Fio vermelho ou fio azul?", "Homem ou mulher (ou nem um nem outro)?", "Saia ou vestido?", "Sapato ou chinelo?", "Predestinação ou livre-arbítrio?", "Deus existe?". Como estar entre duas linhas, ter de decidir um caminho, e não saber qual? Complicado, complexo, incerto e tão difícil, que talvez você esteja no quarto ano de medicina e desista para fazer Filosofia para tornar-se um professor de Ensino Médio.

Em um texto mais antigo que escrevi, falei sobre "Se certeza nenhuma temos, qualquer decisão é certa", mas agora, não quero falar sobre a decisão tomada em cima da incerteza, mas o caminho que nos leva a ela e ir além, como lidar com ela. Isto se esta for um problema. Pode ser que a incerteza seja algo bom, não sei... Estou incerto quanto a isso... hehehehe.

Acho que a nossa necessidade por ter resposta para tudo é a primeira coisa que nos leva a incertezas. Temos por alguma razão o desespero de ter TODAS as respostas do mundo, sendo que jamais chegaremos a este ponto. Culpo, por enquanto, a alfabetização, ou a educação básica. O problema deve estar nela, não sei. Só sei que quando criança, perguntei a meu pai: "Pai, de onde vem Deus?". E ele me respondeu: "Sei lá." (lembrando, meu pai é pastor, Teólogo e gênio). Virei-me e voltei a brincar. Um pouco mais crescido fiz a mesma pergunta, obtive a mesma resposta e perdi toda a minha noite de sono! Não conseguia mais dormir pensando de onde tinha vindo Deus e a pergunta subsequente a esta: "Se não vem de nenhum lugar... Como pode existir?".

De algum jeito, me treinaram a não estar apto para viver com "situações talvez". Se veio, para onde vai, se está ou onde esteve eu não sei, logo, estou sempre no talvez. Mas antes, o talvez me satisfazia. A incerteza fazia parte da alma e não me arrancava o sono. Entretanto, dentro de uma igreja (como a em que cresci), existe um livro do qual sempre me ensinaram que tirava todas as dúvidas e incertezas de todas as pessoas do mundo! Logo, tirava todas as dúvidas do mundo, seria o livro das respostas! Tiraria minha incerteza e me tornaria conhecedor de todos os mistérios do mundo, um perfeito Oráculo.

O novo problema é que quanto mais lia aquele bendito livro (literalmente), mais incertezas eu tinha. Dúvida, dúvida, dúvida. Para um ser criado num mundo informatizado binário de "Sim" e "Não", as vezes com a possibilidade do "Cancelar", mas que equivale ao "Não", falta sempre o costume do talvez. Antigamente, o que movia os filósofos, cientistas, inovadores e seres humanos, era o mistério, as dúvidas a tentativa de compreender as perguntas e conviver com elas. No atual futuro, ao que parece, o mundo já foi desvendado, tudo conhecido, tudo solucionado, logo não há a necessidade de pensar e refletir. Está com dúvida? Entre no Google, vá a uma Enciclopédia ou simplesmente elimine-a, pois ela já foi pensada por alguém, já está solucionada e você pode e deve optar por esta descoberta, por esta resposta.

Tudo está quadrado, esquadrinhado, codificado e preparado para ser assimilado sem a necessidade da digestão, por seu organismo. Não tenha dúvidas, apenas certezas. Mais um problema é que num mundo desta magnitude, não há espaço para fé. Fé é confiar em algo incerto. Não em algo que não exista, num nada, mas em algo incerto, que tem a possibilidade de existir ou não. Mas, para que haja esta possibilidade, é necessário que haja uma "situação talvez".

Argumentos que tentem provar o incerto fazem parte do niilismo, o culto e o incentivo ao nada. É querer acabar com a única coisa que move o homem e o traz esperança, a fé. Acreditar que amanhã talvez seja um dia melhor é pura fé. Arrancada de alguém, leva-o a morte. Nitzsche diz em seu livro "Para além do Bem e do Mal", o seguinte: "Creio que exista quem prefira estar num nada assegurado, do que a possibilidade do incerto". Mais um vez, ponto pro Nitzsche. Tentamos provar o incerto transformando-o num nada. Mas agora, é um nada cheio de certeza. Continua sendo nada. A possibilidade da incerteza é muito mais nobre: "Não sei, por isso creio, por isso confio".

No espaço da incerteza reservada para Deus, coloca-se mais uma vez a fé. Dentro das infinitas possibilidades, o Deus eterno e infinito preenche a todas. Quanto a arrogância religiosa de tentar provar Deus e raciocinar a certeza de que este cabe dentro de seus argumentos, cérebros e conceitos vazios, é nada. Pura perda de tempo e gasto de paciência. Se existe ou não Deus ou se Jesus foi ou não Deus, são perguntas que devem perdurar para sempre, para que as dúvidas continuem rondando e a fé preenchendo os espaços dos corações dos homens. Se a bíblia estava certa, se é literal, se as coisas nela aconteceram, são perguntas que devem existir para o crescimento no conhecimento e na graça.

Esta eterna "situação talvez", deve tornar-nos como crianças, que ouvem respostas incertas, mas estão abertas e preparadas para entrarem e compreenderem o Reino dos Céus. Vivamos independentes da concretude, mas vivamos pela fé. Fé num amanhã incerto, num Deus incerto, num fim incerto. Mas fé. Que nos faz viver e viver uma vida em abundância, uma vida eterna, uma vida incerta preenchida por fé, confiança. As certezas passarão, se transformarão, ruirão para dar lugar a novas. Mas as incertezas nos empurram para o Eterno.

Um comentário:

  1. A fé anda de mãos dadas com a dúvida, se fosse fato não seria fé, fé substitui por assim dizer as “provas” sendo ela mesma a prova.
    Fé não se discuti, o que podemos discutir é a teologia da fé, pois fé tem razões que a propria razão desconhece, sendo apenas razões de fé pela fé.

    Abraços

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