quarta-feira, 6 de abril de 2011

No Psicólogo

A luz baixa na saleta de chão esverdeado destacava uma figura interessante sentada em um sofá um tanto confortável. O sofá, porque o figura não sentia-se muito confortável, nem um pouco a vontade. Tremia a perna direita num silêncio comedor de palavras. Foi quando ouviu de um outro não muito destacado sentado depois da mesa de madeira pintada de branco: "Podes começar, dize-me...". A figura assustada reclinou a cabeça, fechou os olhos, respirou fundo e desatou a falar. Contou de sua conturbada infância quando morava num prédio acinzentado na zona sul de São Paulo, seus dois gatos pretos e o papagaio João, este, presente da vizinha negra do apartamento 62 que jogava búzios e tarô. Isso sem contar no trabalho não divulgado de amarrações para o amor (com pagamento mediante a resultados). Declarou ter medo do escuro desde que se conhece por gente e que até hoje, depois que sua mulher dorme, levanta-se e acende a luz do banheiro no corredor. No dia seguinte culpa o "sonambulismo" que não tem. Sua mulher inclusive que não é bem mulher... Não que seja homem, jamais... É que não é de papel passado sabe? Aliás, naquele corpo feminino nada tem de passado...

Relembrou também das tristes experiências religiosas pelas quais passou. Fora católico quando criança, batizado e crismado, metaleiro adorador de Ozzy Ousborne na adolescência, budista na faculdade e vez por outra mudava para religiões jamaicanas adeptas à ervas contemplativas nesse mesmo período. Passou um tempo ateu na juventude boa e decidiu tornar-se evangélico quando conheceu a bela moça com quem é "casado". Desde então mantém a mesma profissão de fé, apesar de sempre ser assolado por dificuldades, crises e demônios que grudam eu seu encalço. Pois bem! Poderia ser este seu problema: os demônios! Seria possível? Com certeza... Até provável... Mas como derrotar estes seres? E se não forem eles? O que é bastante provável também... O que fazer?

- O que achas? O que devo fazer? perguntou o figura recuperando o fôlego respirando fundo novamente (ou profundamente...).

- Dize-me.

- O que?

- Dize-me...

- Dizer-te o que? Acho que já disse tudo! A menos que... Sim! Devo dizer-te de meus fantasmas psicológicos, minhas sombras do passado, tentar encontrar uma raiva reprimida ou algo assim. Ou quem sabe deva contar-te os segredos das mentiras que contei e não me fazem bem até hoje. Pode ser também que deva dizer-te meus sonhos, meus anseios, meus desejos certo? Até aqueles vestidos de muita terra dentro de meu subconsciente. Dizer-te minhas psicopatias e anomalias, minhas esquisofrenias os defeitos do psiquismo... É isso?

- Não. Dize-me!

- Dizer-te o que, Santo Cristo?!

- Não! Di-zi-me!

- Ah! Sim! Porque não disses-te antes? Devo dizimar estes problemas! Aniquilá-los! Derrotar meus monstros internos! Estas feras não me deixam dormir, trazem problemas para casa e para a cama, tanto com o travesseiro quanto com a minha mulher... Mas este é um outro problema, devo dize-lo a tu ou dizimá-lo antes mesmo? Aliás, como devo dizimá-lo? Com tapas? Pensamento positivo? Livros de auto-ajuda? A Bíblia? Oração...

- Não! Dizime, homem de Deus! Dizime! Não (a)creditas em Deus? Dê tua parte e entregue esses caminhos ao Senhor! Tudo mais ele fará... Olhe, a nossa conta corrente está nesse cartão e se preferires também aceitamos dinheiro ou cartão de crédito. Apenas tenha fé e (a)credites em Deus. Dizime!

- Ah pastor... Se é assim, acho que é melhor pagar e ir no psicólogo...


Gratis i Kristus

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