quarta-feira, 10 de março de 2010

O Mentiroso

Nas últimas semanas tenho ouvido praticamente todo "santo dia" a mesma pergunta; "Você acredita no Diabo?". A primeira coisa que vem em minha mente é uma resposta que aprendi com um grande amigo meu, Joel Cardoso; "Eu não, ele é 'mó' mentiroso". Mas imagino que essa não satisfaça a questão levantada. O que de fato se questiona é a existência do Coisa Ruim, Satã, Pé Preto, Tinhoso, Do Mal, Príncipe das Trevas, Lúcifer, Sãopaulino... Diabo.

Antes de chegar a uma resposta definitiva, fechada ou coisa do tipo, temos que refletir sobre o sentido, significado e a imagem que temos em nossa mente quando é mencionada a palavra Diabo. Diabo seria um ser que em si teria toda a maldade, a personificação do mal. Diabo seria inimigo de Deus. Diabo tentaria o homem. Diabo coordena, organiza e dirige um exército de outros diabos menores que visam levar as pessoas ao inferno. Logo, se o Diabo tem tudo isso ai, está em guerra com Deus. Qual seria então nossa função nessa batalha? Somos prêmios? Mas a guerra já não está (presente) ganha? Já não somos salvos? Livres? O Diabo já não perdeu seu poder?

O Diabo não é um anjo caído. Em lugar nenhum da Bíblia existe menção a esta definição. Se ele não é um anjo caído (ou mesmo se for), de onde vem? Se não foi criado por Deus, é um ser incriado, logo, igual a Deus. Se é igual a Deus, tem equivalência de forças e há uma guerra, uma batalha na qual não sabemos quem ganha, sem contar que contraria a nossa afirmação de Deus ser o Todo Poderoso, único Deus, pois estaria em uma competição com um ser igual a Ele. Se foi criado, foi Deus quem o criou. Se Deus criou-o como anjo e este se rebelou, temos que pensar se os anjos possuem livre-arbítrio. Se possuem, isso pode acontecer novamente. Porque Deus lançaria o Diabo, que se rebelara contra Ele, para fora do Céu, direto à terra, com poderes maiores do que o dos seres amados por Deus (os humanos) ao invés de da-lo um fim? Se na Bíblia, o juízo divino contra os homens que se rebelam contra sua leis é sempre fatal e drástico. Isto porque seriam os seres amados, fracos, sem conhecimento direto do próprio Deus, enquanto que o anjo que tinha direto contato com Ele é colocado em um reino no qual agora controla e ainda inferniza a vida dos homens.

Se o Diabo é criado por Deus, se rebela contra Deus, não é punido por Deus, então Deus é conivente com sua existência (lembrando, ele é a personificação do mal). Deus teria controle sobre o Diabo? Permitiria sua livre relação com a humanidade? Mas Deus não compactua nem se agrada e nem tem parte com o mal! Aí há mais um sério problema para que haja espaço para um Diabo como nós o definimos. Sem levar em conta que: o Diabo seria o total contrário de Deus (o anti-Deus), por isso pai da menitira, enganador. Já que Deus é fiel, cumpre suas promessas, o Diabo é infiel e não cumpre com suas palavras. Como é que um grupo de demônios, maus, detentores de toda a maldade, infiéis, trabalham em conjunto sob a liderança de um ser pior que eles, tão mal quanto eles, permanencendo leais ao projeto maligno inicial que seria... Não consigo imaginar qual seria. Mas o intrigante é o como que eles se respeitam, trabalham juntos, amigos, num mesmo propósito e fiéis?

Pensando no lado de Deus, se Ele é bom, amoroso, FIEL... Revelado plenamente em Jesus Cristo, o Verbo que se fez carne, como é possível imaginar que Ele permita que um ser maior que eu, mais poderoso que eu, intocável e invisível a mim, de outra realidade, arrebente com minha vida? Destrua sua criação? Deixe que o mundo se desfaça em suas mãos? Deixe que ele comande e seja dono de sua criação?

Para crer que exista um Diabo, é necessário a admissão de uma de duas posições. A primeira é crer que ele é igual a Deus, ou, tão poderoso quanto, e está em uma guerra cósmica. Ou, a segunda, que ele é (como na tradição protestante) um cachorro raivoso na coleira de Deus. Deus permite sua existência, usa de sua maldade, para atingir seus objetivos e para que este faça seu trabalho sujo.

Nenhuma dessas duas opções, até onde sei, se encaixa numa fé cristã. Mas, se para você sim, a existência de um Diabo é possível. Se não concorda com nenhuma dessas duas opções, deve repensar seu conceito de mal, Diabo, inferno, demônios... E descobrir uma nova maneira de enxergar as coisas. Quando menino fazia coisas de menino, depois de homem, faço coisas como homem não mais como menino. Se nenhuma das duas possibilidades de existência de uma personagem com toda a maldade em si se encaixa em sua teologia, não existe esse Diabo. Bem vindo a um novo mundo...



OBS: Onde lê-se a palavra "anjo" na Bíblia, deve-se ler mensageiro. Isso abre novos caminhos a serem percorridos e retira nossos preconceitos com o texto. Se esse ser repleto pelo mal não tem espaço, onde se encaixa agora as tentações? De onde vem a maldade? Precisamos reler e refazer nossas respostas tradicionais sempre prontas e que se contradizem. Precisamos repensar a maneira que trabalhamos nossa fé e mais ainda, como vivemos nossa vida. Coisas que para nós é Deus, para nossos irmãos pode ser o Diabo, e vice-versa. Como então saber o que é Deus e o que é Diabo? Se é que há um Diabo...

Um comentário:

  1. Amigão Brunão, o conceito diabolico (não consegui resistir a piada diabolica. Rsrsrs) da existencia do diabo na teologia classica é um grande problema paradoxal, que é facilmente resolvido e desatado este nó godio com a afirmativa negativa de sua não existencia.

    Abraços

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